Título: `Picolé de chuchu não me incomoda¿
Autor: Juliana Rocha
Fonte: Jornal do Brasil, 22/01/2006, País, p. A2

Avesso à política feita na base da cotovelada, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, desferiu o primeiro golpe na briga interna do PSDB para escolha do candidato do partido à Presidência, desde que colocou a pré-candidatura pela vaga. Calmo, porém determinado, ele busca agora conquistar o apoio do partido e cair no gosto popular. O governador recebeu a reportagem do JB para um encontro de quatro horas e meia. Primeiro um corpo-a-corpo em uma escola da Zona Leste da capital, depois uma parada para o cafezinho e um vôo de helicóptero pela cidade. Por fim, um bate-papo no Palácio dos Bandeirantes. Na parede do gabinete, exibe uma foto do antigo comandante Mário Covas, de quem diz ser co-piloto. Entre os sofás, dois porta-retratos: da primeira-dama Lu Alckmin ¿ uma unanimidade entre as paulistanas ¿ e do filho Thomás, com a netinha então recém-nascida. ¿Agora ela já está grande¿, justifica o avô coruja. Aos 53 anos, ele não está disposto a abrir mão do sonho de ser presidente. Alckmin conta que começou aos 19 anos como vereador de Pindamonhangaba. Em seguida, foi eleito prefeito, passou pela Constituinte e por dois mandatos na Câmara. Ele ressalta que nutre carinho pelo Rio. Desde que entrou em campanha, esteve no estado seis vezes. Sua preocupação agora é tornar-se conhecido no país inteiro sabendo que, mesmo no comando do maior estado da federação, não é popular fora de São Paulo. Mas ele bem que se esforça e justifica que para ser conhecido é preciso ser ator de televisão, jogador de futebol ou concorrer a uma eleição nacional, em referência a José Serra, prefeito de São Paulo, também aspirante à Presidência. Serra exibe melhor desempenho nas pesquisas de intenção de voto contra o presidente Lula. O lema de Alckmin é: menos blá-blá-blá e mais eficiência e, com isso, espera angariar o voto dos brasileiros, principalmente depois dos escândalos de corrupção. O governador justifica que vai crescer nas pesquisas quando começar a campanha e puder aproveitar o horário gratuito no rádio e TV do partido.

O senhor foi visto como um político de pouco carisma. Está tentado mudar?

- Sei que meu apelido é picolé de chuchu e não me incomoda porque é meu jeito, minha forma de fazer política. Mas adoro o povão. Fui co-piloto de Mário Covas, um grande comandante. Tinha consciência de que a ribalta era para o governador, então sempre fui discreto. Isso é confundido porque, muitas vezes, a política é feita na base da cotovelada. Faço nova política, com menos blá-blá-blá e mais resultados. Também nunca fui de gritaria e oportunismo, nunca falei mal dos outros porque acho atrasado.

Quais são suas diferenças em relação a Lula?

- Quero ser o presidente do desenvolvimento. Esse é o grande desafio. O Brasil amadureceu e está em outro patamar. A sociedade não aceita mais a volta da inflação. E ninguém tem o direito de deixar para o seu sucessor um governo quebrado, comprometendo as futuras gerações. O trabalho do presidente Fernando Henrique passou a ser supra-partidário. Mas ter moeda estável e responsabilidade fiscal não é mais objetivo de governo, é pré-requisito. O grande objetivo é reduzir a pobreza com aumento do emprego e renda.

Mas esta plataforma é a mesma do presidente Lula.

- Não vejo como ele pode usá-la. Para se reeleger, é preciso ter um grande governo. Esse é um governo fraco, de baixa eficiência. É preciso também ter um grande sonho para merecer mais quatro anos. No ano passado, com o cenário internacional de céu de brigadeiro e os países emergentes crescendo 6%, não há nada que justifique o Brasil ter crescido pouco mais de 2%. Perdemos uma oportunidade que não volta. O emprego formal encolheu 18% em 2005. O governo não anda. Não tem nenhuma reforma estruturante que tenha avançado.

Mas como os juros podem cair e o emprego aumentar?

- É difícil citar um número de geração de empregos, mas o Brasil é vocacionado para o crescimento. Das décadas de 30 a 50, o país cresceu mais de 5% ao ano. Quando saio nas ruas, volto com o bolso cheio de bilhetinhos e, de cada dez, nove são pedidos de trabalho. Precisamos dar oportunidade de trabalho e condições de produzir. Este governo praticou uma taxa de juros muito alta que esfriou a economia. Estamos com o binômio juros altos e câmbio baixo, que prejudicam o Brasil na veia, além de uma carga tributária absurda. É necessário fazer reformas inadiáveis, cujas palavras são eficiência e qualidade do gasto público. O modelo tributário é absurdo. Só o ICMS tem 55 alíquotas.

Quais são as suas diferenças em relação a José Serra?

- Provavelmente muito poucas, se é que existem. Não me julgo nem melhor, nem pior, afinal, pertencemos ao mesmo partido. Temos o mesmo ideário social-democrata. A diferença é mais de estilo. Coloquei o meu nome à disposição do partido. Acho que estou indo muito bem e trabalho para ser o candidato do entendimento.

Serra foi muito crítico com a política econômica de FH. Como o senhor avalia esse período?

- O Brasil vive um outro momento. O nosso tempo é o da velocidade da mudança. Quem não andar depressa, vai ser lanterninha. Quando JK dizia 50 anos em cinco, transmitia o sentido de urgência. O Brasil precisa pisar no acelerador e o governo atual perde todas as oportunidades de avançar. O Brasil precisa de uma agenda positiva, com a educação no centro.

O senhor tem 53 anos. Ainda é jovem. Por que não espera para concorrer à Presidência?

- Política é destino e eu acho que chegou a minha vez. Tenho dito que o candidato do PSDB é o meu candidato e, portanto, trabalho pelo Geraldo Alckmin porque estou otimista de que vou ser escolhido. Completo agora um trabalho de mais de 11 anos nesta Casa, que me preparou. Diferentemente do governo do PT, nós temos o que mostrar. Já que reduzimos os impostos, aliviamos o contribuinte, estimulamos o setor produtivo e aumentamos a capacidade de investimento do estado. A grande diferença é saber fazer mais com menos dinheiro.

Como será a escolha do candidato pelo partido?

- O nosso esforço é pelo entendimento. Acredito que não vai haver disputa. O presidente do partido, senador Tasso Jereissati é um líder extremamente experiente. O presidente Fernando Henrique é a grande referência e já foi desmentida essa história de que ele tem preferência pelo Serra. Falo com ele toda semana. Quem apostar na divisão do PSDB vai errar. Não está descartada a escolha por prévias, mas acho pouco provável já que não é tradição do PSDB. A Convenção só pode ser feita em julho, depois do prazo de desincompatibilização. Vou sair do governo no dia 31 de março.

Como o senhor enfrenta a rejeição no partido com a notícia de que pertence ao setor conservador da Igreja Católica, o Opus Dei?

- Primeiro, não pertenço ao Opus Dei. Meu tio Zeca pertencia e minha prima Maria Lúcia pertence. Eu respeito quem tem fé, independente da religião. Mas faz mais de 100 anos que o Estado é laico. E quanto à minha rejeição, menor é impossível e entendo que é um diferencial importante porque o segundo turno depende de rejeição baixa. Essa é a grande dificuldade de Lula, que é um candidato forte no primeiro turno e terá dificuldade no segundo para construir maioria absoluta.

O senhor diz que não é conhecido nacionalmente. É verdade?

- É verdade. O governador de São Paulo não é conhecido porque vivemos no mundo da televisão. É difícil participar de programas nacionais. Quem não é artista, jogador de futebol ou não disputou a eleição nacional, não é conhecido. Mas isso muda rapidamente com a televisão. O uso do tempo de TV na fase de pré-candidatura é uma decisão partidária, mas aquele que for candidato vai ter um tempo muito bom na TV para expor suas idéias.

Como foi seu período como líder da Câmara?

- Comecei no legislativo aos 19 anos, na Câmara municipal de Pindamonhangaba. Aos 23, fui eleito prefeito do município e depois fui vice-líder de Covas na Constituinte. Passei pela Câmara dos Deputados duas vezes. A política é diálogo e conversa. Se for eleito, no primeiro dia de governo todas as reformas estarão no Congresso para não perdermos tempo. Mas tem coisas que não dependem do Congresso. Com um choque de gestão, não precisa de lei nenhuma, só de vontade.