Título: BC acelera queda dos juros
Autor: Rafael Rosas
Fonte: Jornal do Brasil, 19/01/2006, Economia & Negócios, p. A17

A noite foi longa para os integrantes do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), que teve ontem uma das mais longas reuniões desde a sua criação, em 1999. Em decisão unânime, os integrantes do comitê cortaram a taxa básica de juros da economia (Selic) em 0,75 ponto percentual, para 17,25% ao ano. Apesar do consenso entre os nove participantes, o encontro durou quase cinco horas e só terminou às 21h30. A decisão refletiu a expectativa de parte do mercado financeiro, que alegava que os atuais indicadores da economia brasileira proporcionam o momento ideal para um corte mais brusco nos juros básicos.

Os que defendiam corte mais tímido, de 0,5 ponto percentual, alegavam que os recentes repiques da inflação ¿ ontem, a Fundação Getulio Vargas divulgou que o IGP-10 de janeiro ficou em 0,84%, contra 0,06% em dezembro ¿ e as instabilidades no mercado internacional recomendavam cautela em pleno ano eleitoral, período propício a sobressaltos nas economias de países emergentes.

Marcelo Salomon, economista-chefe do Unibanco, afirma que nunca viu ¿o BC reagir a uma prévia de inflação¿, em referência ao avanço do IGP-10. Segundo o analista, o Copom mirou no nível da atividade econômica, que está, segundo ele, abaixo do esperado.

¿ O Banco Central previa 2,6% de crescimento do PIB no ano passado, o que não vai ocorrer. Vai ficar muito mais próximo da nossa estimativa, que é de 2,2% ¿ afirma.

No terceiro trimestre de 2005 houve recuo de 1,2% no Produto Interno Bruto (PIB) do país e o setor produtivo não poupou críticas ao modelo de restrição imposto pela equipe econômica do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Para Octávio Vaz, sócio da Questus Asset Management, a subida de preços observada neste começo de ano é sazonal, ligada principalmente ao período de entressafra agrícola e o Banco Central precisava dar ao mercado uma indicação mais clara de que vai aproveitar a atual conjuntura para aliviar a pressão dos juros.

Vaz afirmou ainda que o Copom não poderia perder a ¿janela de oportunidade¿ que se abriu com o risco país no piso histórico, a dívida atrelada ao cambio reduzida de forma drástica, a Bolsa de Valores de São Paulo em patamares recorde e o dólar nos níveis mais baixos desde 2001.

¿ A política de juros altos já trouxe ao país a credibilidade necessária, mas afetou o crescimento. Se o BC fizesse política monetária somente em cima da inflação atual, nunca teríamos juros baixos no país.

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, preferiu criticar a decisão, alegando que o corte foi ¿muito modesto¿.

¿O corte de 0,75 ponto percentual ainda significa uma postura extremamente cautelosa e conservadora do Banco Central¿, afirmou Monteiro Neto. "Lamentamos a decisão porque acreditamos que o Brasil precisa aproveitar as oportunidades para garantir taxas de crescimento mais altas em 2006".

Eduardo Galasini, gerente de tesouraria do Banco Banif, pondera que o corte de 0,75 ponto percentual efetuado ontem leva a risco de cortes menores no futuro.

¿ O mercado internacional está estressado com o preço do petróleo e a inflação subiu. O BC corre o risco de ter que diminuir o movimento de redução de juros nas próximas reuniões, já que a meta de inflação de 4,5% para este ano é muito ambiciosa ¿ ressalta.

Vaz, da Questus, rebate afirmando que, na atual situação da economia, ¿não faz diferença se a inflação fica em 3,5%, 4,5% ou 5,5% ao final do ano¿, já que o governo conquistou a confiança dos investidores.

Salomon, do Unibanco, no entanto, lembra que este ano, com o alto patamar dos juros reais, o crescimento econômico pode ser até menor que em 2005, ¿com uma inflação ainda menor¿.

¿ Com os dados econômicos que temos disponíveis hoje, a possibilidade é de novo corte de 0,75 na próxima reunião, daqui a seis semanas ¿ revela.

Em nota, o presidente da Fecomércio-RJ, Orlando Diniz, defendeu uma queda mais forte dos juros nas próximas reuniões. ¿Enquanto isso não acontecer, a falta da capacidade de investimento estará sempre puxando para baixo o crescimento do país¿.

A Federação das Indústrias do Rio (Firjan) divulgou nota criticando o impacto dos juros altos no endividamento. ¿A política econômica deve avançar mais rápido nas condições necessárias para acelerar os cortes de juros e evitar, sobretudo, medidas que implicam em aumento permanente de gastos públicos¿.