Título: Cineasta fez apelo aos amigos no leito de morte
Autor: Soraia Costa
Fonte: Jornal do Brasil, 01/02/2006, Brasília, p. D8

Afonso Brazza nasceu em 17 de abril de 1955 em São João do Piauí (PI). Aos quatro anos, veio para o Gama com a família e, aos 14 partiu para São Paulo em busca de novas oportunidades. Brazza conheceu o cinema na Boca do Lixo, reduto paulistano conhecido pela produção de filmes populares e de baixo orçamento, como as pornochanchadas. Na época o cinema marginal estava em alta e lançava mais de 50 filmes por ano. Neste clima de euforia, Brazza aprendeu a operar a câmera, conheceu José Mojica Martins, o Zé do Caixão, e participou de produções assinadas por David Cardoso, Tony Vieira e Ozualdo Candeias.

Com a decadência da Boca do Lixo, no início dos anos 80, Brazza voltou para o Distrito Federal. Virou bombeiro para ter uma renda fixa e fez seu primeiro filme, O Matador de Escravos, em 1982. Três anos depois, finalizou seu segundo longa-metragem, Os Navarros.

- Quando conheci Afonso Brazza, em 1999, ele já tinha feito seis filmes e estava pensando em desistir. Na época eu era deputado federal e decidi ajudar. Ele saiu do quartel e foi servir no meu gabinete, na área de segurança, pois assim ele poderia fazer cinema. Convidei personalidades da política e da música para participar do elenco de Tortura Selvagem - A Grade. Em agradecimento Brazza me deu o papel do delegado - lembra Ricardo Noronha, secretário adjunto da Agência de Desenvolvimento Econômico e de Comércio Exterior do GDF.

Noronha foi um dos maiores colaboradores de Brazza e participou dos últimos momentos de vida do cineasta.

- Após as gravações de Fuga Sem Destino fiquei uns 40 dias sem encontrar o Brazza. Fiquei surpreso quando Pedro Lacerda me telefonou dizendo que ele estava doente na casa de um irmão no Gama. Fui até lá e fiquei chocado. Ele estava magro e tossindo muito. Fui com ele até o Hospital do Gama e o médico falou que Brazza estava em estágio terminal por causa de um câncer e que nada podia ser feito. No Hospital de Base o diagnóstico foi o mesmo. Isso foi em um sábado. Na terça-feira seguinte ele morreu - conta Noronha.

Em seu leito de morte, Afonso Brazza pediu aos amigos que concluíssem seu último filme. Ele fez uma lista de pessoas autorizadas a fazerem a finalização, entre elas o cineasta Pedro Lacerda.

- Todo mundo está lutando para finalizar esse filme. A produtora me cedeu uma cópia com a sequência numerada para que eu mostrasse aos empresários e tentasse um patrocínio. Assisti à fita e é excelente. Esse filme é o melhor de Brazza. Tem uma sequência lógica, uma história, mas continua sendo um bangue-bangue característico das produções de Brazza - garante Ricardo Noronha.

O secretário adjunto acredita que será difícil aparecer um substituto à altura de Afonso Brazza. Mesmo antes de finalizar Fuga Sem Destino, o cineasta-bombeiro já havia preparado seu nono longa-metragem, Candango Jango.

- Brazza passou pelo mundo para deixar a mensagem de que é possível alcançar tudo desde que se tenha vontade e persistência. Pessoas como Brazza não morrem - afirma Noronha.

Responsável pela captação dos recursos para a finalização, o cineasta Pedro Lacerda destaca outra dificuldade para manter a memória de Brazza. Apenas dois filmes No Eixo da Morte (1997) e Tortura Selvagem - A Grade (2001) tiveram seus originais preservados.