Título: Da prefeitura à aldeia guarani, cenas da carência
Autor: Israel Tabak
Fonte: Jornal do Brasil, 29/01/2006, País, p. A2

Na delegacia, na prefeitura, na aldeia guarani, ou na casa do príncipe dom Dom João de Orleans e Bragança, Paraty vive problemas e carências iguais aos de tantas outras cidades brasileiras. A fama internacional não foi suficiente para livrá-la de situações tragicômicas. Numa ante-sala do gabinete do prefeito, por exemplo, o turista chileno Rodrigo Morales Fernandes, assaltado quando voltava da praia, está revoltado não tanto pelo roubo mas pela maneira com que foi recebido na Secretaria de Turismo:

- A funcionária me disse apenas que não compreendia ''gringo'' - protesta.

A violência, com destaque para os assaltos aos charmosos restaurantes da cidade à luz do dia, têm aumentado muito, reclama um dos mais ilustres moradores de Paraty, o príncipe dom João, que brada contra a ausência de um planejamento integrado, em todas as esferas de poder.

O policial Álvaro Benito, chefe do grupo de investigação da delegacia avisa que a cidade se transformou num entreposto do tráfico, com a presença já sedimentada do Primeiro Comando da Capital, o temido PCC de São Paulo. O policial suspeita que o aeroporto do município, administrado por um consórcio particular, seja usado para transportar drogas, pois é falho o controle de quem usa as pistas. O JB comprovou: os que chegam ou saem preenchem uma ''estatística de movimento'', sem que sejam exigidos documentos para checar os dados.

Elber Dedini, da empresa que controla os pousos e decolagens, esclarece que não está autorizado a checar informações ou exigir documentos e confirma que o aeroporto é publico - qualquer aparelho pode usar a pista.

- Se policiais do Rio têm suspeitas, devem comunicá-las à Polícia Federal ou ao DAC. A imensa maioria dos que operam aqui são pessoas conhecidas e, até agora, não notamos nada suspeito.

Não distante dali, na aldeia guarani, a preocupação do líder Darci Tupã é diferente. Ele mostra um livro de alfabetização na língua nativa e fala de um coral de crianças, ensaiado a três vozes, criado para resguardar cantos da tribo. Darci lamenta o pouco caso das autoridades para a experiência, que poderia se integrar aos atrativos culturais do município. No rol das incoerências, exemplos não faltam.