Título: Famílias ocupam clube da Vila Planalto
Autor: Lígia Maria
Fonte: Jornal do Brasil, 02/02/2006, Brasília, p. D5

Antes destinada ao lazer da comunidade, área virou abrigo para seis famílias e recebeu benfeitorias indevidas do governo

O clube Vizinhança da Vila Planalto, que deveria ser uma unidade de lazer, tornou-se um local de abandono e motivo de impasse entre a comunidade e o governo. Além da sujeira que toma conta do terreno, seis famílias moram na área que é pública. O espaço também recebeu, há cinco anos, benfeitorias indevidas. Há um restaurante e três quadras de tênis sem alvará de funcionamento. Ainda assim, a diretoria do clube recolhia, até novembro, aluguel dos empreendedores. Marileide de Souza e Silva, diretora-presidente da entidade, apresentou documento, que, acredita, dá direito ao uso do terreno. Trata-se de um Termo de Concessão de Uso Precário, emitido, em fevereiro de 2000, por Rodolfo Nogueira Jr., ex-subadministrador da Vila Planalto. Nogueira Jr não tinha poderes para realizar a transferência e a Administração de Brasília não reconhece o documento. Marileide conta que desde junho do ano passado, quando assumiu o comando da diretoria, tenta melhorar as condições do lugar, que sequer está cercado, e ajudar as famílias a encontrar um outro local para viver.

- O administrador de Brasília disse que nosso documento não tem validade. Mas a questão aqui precisa de solução. Os moradores da Vila Planalto querem tornar essa área um clube de verdade - diz.

A presidente do clube está preocupada com o estado deplorável do local. Abandonado até 2000, o terreno teve várias invasões e ações criminosas.

- Havia um ponto de tráfico de drogas aqui até o final do ano passado, que deu muito trabalho para ser removido - comenta.

Erros - Marileide Silva quer cercar o local para acabar com os problemas de segurança e invasões. No entanto, a tarefa caberia ao Governo do Distrito Federal, dono do terreno. Além da cerca, a comunidade planeja outras obras no local: piscina, quadra de futebol de salão e recuperação das instalações, como vestuário e arquibancada do campo de futebol - antigo gramado do Departamento de Força e Luz (DFL).

Renato Carvalho, chefe de gabinete da Administração de Brasília, disse que existe o entendimento de que a área deve ser entregue à comunidade, mas que isso não pode ser feito à margem da legislação. A Administração está consultando a Procuradoria para que saber de que modo a concessão do terreno pode ser feita.

- Não podemos entregar um problema para a comunidade. Será preciso um contrato de concessão de uso para que as partes envolvidas, governo e diretoria do clube, sejam parceiras e tenham obrigações definidas - explica.

O porta-voz do governo do DF, Paulo Fona, diz que é preciso aguardar o parecer da Procuradoria sobre a questão, antes de tomar qualquer atitude. Isso inclui o cercamento da área e a transferência das famílias.

Moradores - Antes dos 27,6 mil metros quadrados de área do Clube Vizinhança serem destinados ao lazer, o que ocorreu em 1992, o pedreiro Expedito Nogueira já estava no local. Mora ali há 34 anos. Hoje, com quatro filhos e a mulher, ele não tem interesse em se mudar e faz questão de ignorar a destinação do terreno. Em sua defesa, Nogueira apresenta documento do lote, registrado no 2º Cartório de Registros de Imóveis.

- Dizem que isso aqui é área de clube, mas eu não me mudo por nada - afirma.

O desempregado Adalberto José da Silva, vizinho do pedreiro há 20 anos, diz que iria para outro lugar, contanto que isso signifique melhoria de vida para a família. Há uma semana, a fossa do barraco, que fica no cômodo vizinho à cozinha, estourou. Agora, ele teme pela saúde dos parentes.

- Isso daqui não é vida para ninguém - reclama.

A dona de casa Luiza de Carvalho não tem banheiro em casa, mas não vê motivos para mudar-se para uma outra cidade do DF - ela e os seis filhos usam os banheiros e o gramado do clube para tomar banho e fazer as necessidades fisiológicas. O motivo, segundo Luiza, é que toda a família já está acostumada a proximidade com o Plano Piloto.

- O governo não tem que mudar as coisas para atrapalhar a nossa vida - afirma.