Título: Avanços e entraves
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 28/01/2006, Opinião, p. A10

Os últimos números da economia brasileira, divulgados na quinta-feira pelo IBGE, configuram uma radiografia exemplar do Brasil: um país imerso numa conjunção de boas e más notícias. O ano de 2005, informou-se, terminou com a taxa de desemprego em queda e a renda média em alta. O instituto registrou ainda aumento do número de empregos formais no ano passado. Para muitos especialistas, a economia superou os prognósticos mais pessimistas. O desemprego nas seis principais regiões metropolitanas chegou a 8,3% em dezembro, o menor patamar da série registrada pelo IBGE desde março de 2002. O resultado contribuiu para que, no ano passado, o país alcançasse a menor marca da série histórica - 9,8%. Entre os números da renda média do brasileira, destaque-se o crescimento de 2% em relação ao ano anterior - apesar de modesta, foi a primeira alta desde 1997. Fechando o ciclo de notícias, revelou-se que entre 2004 e o ano passado houve crescimento médio de 5,6% no número de trabalhadores com carteira assinada. A proporção de trabalhadores formais na população ocupada atingiu o nível recorde de 40,3% na média de 2005.

Bons sinais. Conforme sublinhou reportagem do JB, contudo, a desistência de milhares de brasileiros na busca de uma vaga no mercado explica muito mais a queda do desemprego do que a criação de novos postos de trabalho. Mais de 290 mil pessoas saíram do exército de desempregados entre novembro e dezembro. Ao mesmo tempo, apenas 107 mil novas vagas foram criadas. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), o Brasil abriu menos vagas, porém de melhor qualidade. Em contrapartida, o resultado também indica que os bons ventos foram movidos pelo setor de serviços, escondendo um preocupante desempenho da indústria.

Há tantos motivos, pois, para comemorações quanto para inquietações. De fato, é notável que a renda média do brasileiro se eleve pela primeira vez em oito anos ou que a taxa de desemprego atinja patamares inéditos. Ou ainda que a informalidade - uma das chagas crônicas do país - perca um pouco da vasta musculatura exibida nos últimos anos.

Nos três casos, avanços mais substantivos só virão com maior crescimento econômico e as reformas inacabadas que o Brasil insiste em deixar de lado. A geração de empregos, por exemplo, exige esforços que vão muito além dos limites da política macroeconômica. Existem gargalos que precisam ser atacados pontualmente. Um deles é, sem dúvida, o custo elevado da mão-de-obra, por força de uma legislação irrealista e ultrapassada. O Brasil não pode continuar a conviver com leis trabalhistas que datam da primeira metade do século 20.

Do mesmo labirinto, tenta escapar o problema da informalidade. Neste caso, ao alto custo do emprego convém adicionar outros incômodos persistentes, como a magnitude da carga tributária e os entraves burocráticos que sugam dinheiro e energia de milhares de empreendedores. Eis a perversa conjunção de astros que atormenta a vida de empregados e empregadores no Brasil.

Recente estudo do Banco Mundial revelou que estamos entre os piores países do mundo para abrir e tocar negócios. São 17 as etapas, que podem durar até absurdos 152 dias. Um emaranhado de leis, normas e regras tornou-se incompatível com as exigências competitivas contemporâneas. Um empregador tem de pagar, em média, o equivalente a 41 salários para demitir um empregado. Trata-se de um estímulo ao desemprego e à informalidade. A burocracia inibe contratações e atropela relações de trabalho estáveis. Os altos impostos conduzem empresas e trabalhadores às trilhas do mercado informal.

Com tais impasses, não há política econômica que resista. Ainda assim, ressalte-se, o Brasil tem alcançado feitos inéditos, conforme sugerem os últimos números. Mas a constatação não impede a imposição de monumentais desafios. Os debates do Fórum Econômico de Davos têm cristalizado a preocupação vigente nos países latino-americanos, Brasil incluído. A necessidade de investimento em capital humano, a continuidade de reformas econômicas e institucionais e a definição de metas e compromissos públicos (e seu cumprimento, obviamente) constituem a condição para a região crescer como a China e a Índia - grupo de estrelas em Davos do qual o Brasil, infelizmente, deixou de participar.