Título: Mantega adota estilo conciliador
Autor: Janaína Leite, Romoaldo de Souza e Sérgio Prado
Fonte: Jornal do Brasil, 19/11/2004, Economia & Negócios, p. A-18

Com a saída de Carlos Lessa do BNDES, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz outra mudança em seu ministério, sem a presença da sempre polêmica expressão reforma ministerial. E, ao indicar como substituto o ministro do Planejamento, Guido Mantega, abre uma janela para a ida de um político para o primeiro escalão do Executivo, o que ajuda nas negociações com o Congresso. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), adiantou que Lula fará novas mudanças na Esplanada dos Ministérios. O critério será criar um governo de coalizão, com a presença maior dos partidos aliados.

O novo presidente do BNDES assumirá o cargo na próxima segunda-feira, depois de a nomeação ser publicada no Diário Oficial, e já avisou que deverá indicar um novo vice para o lugar de Darc Costa, funcionário aposentado do banco e braço-direito de Lessa.

- O vice precisa ser uma pessoa intimamente ligada ao presidente do banco - justificou Mantega, em entrevista no Palácio do Planalto, depois de ser confirmado.

Segundo ele, sua principal missão será acelerar a liberação de recursos do BNDES, de forma que a instituição sirva às políticas públicas de desenvolvimento. Para o ano que vem, o BNDES tem orçamento de R$ 60 bilhões, que ''não serão contingenciados'', brincou Mantega. Ele se recusou a comentar aspectos cruciais da política de condução do BNDES, como a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) e o custo dos empréstimos. Adotou, no entanto, um discurso brando para explicar a acusação de baixa demanda das linhas de crédito do banco. Neste ano, de um orçamento de R$ 47 bilhões, o desembolso até outubro somou R$ 31,8 bilhões (ainda assim, valor recorde).

- A procura por dinheiro foi menor porque o Brasil estava se relançando no caminho do desenvolvimento. Não é de uma hora para outra que os empresários irão se arriscar - ponderou.

A decisão de trocar o comando do BNDES foi sacramentada ontem, quando Lula recebeu Lessa no Planalto. Depois de duas horas de reunião, o economista deixou o gabinete presidencial sob uma enxurrada de elogios de Lula, porém desempregado. A demissão, aguardada desde a semana passada, quando Lessa classificou de ''pesadelo'' a gestão de Henrique Meirelles à frente do Banco Central, foi bem recebida por parte do empresariado.

- Entendo que não é possível existir, no âmbito da própria equipe do governo, discussões sobre o rumo da política econômica. Isso não é adequado - afirmou o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto.

- Guido Mantega é igualmente íntegro, preparado e com muito trânsito no governo - completou o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf.

A substituição de Lessa provocou uma série de especulações em Brasília. No Congresso, surgiu a versão de que a intenção do Planalto era nomear para o Planejamento o senador Mercadante.

- Vou continuar líder do governo no Senado - afirmou Mercadante, depois de retornar do encontro com o presidente Lula.

Por enquanto, a saída encontrada pelo governo foi indicar como sucessor de Mantega um técnico, o atual secretário-executivo do Planejamento, Nelson Machado. Com os olhos voltados para o novo cargo, Mantega deu o tom da nova administração do BNDES. O ministro se esquivou de falar sobre os motivos que levaram à saída de Lessa. Também ficou calado sobre a polêmica envolvendo o Banco Central. Escorregou, contudo, na hora de explicar qual será a relação do BNDES com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Apesar de, em tese, seu superior hierárquico ser o ministro Luiz Fernando Furlan, Mantega disse que se reportará diretamente ao Palácio do Planalto, ao Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e à Câmara de Política Econômica, evocando declarações semelhantes de Lessa.

- Essa discussão (a da hierarquia) é semântica - cortou, quando perguntado sobre o poder de mando de Furlan.

O ministro do Desenvolvimento, maior desafeto de Lessa, não estava em Brasília quando Lula bateu o martelo sobre a troca.

Com mais uma mudança no ministério, o governo Lula vai aos poucos dando forma a sua fisionomia para enfrentar os dois últimos anos de mandato. No início do mês, saiu o ministro da Defesa, José Viegas, substituído pelo vice-José Alencar. Nesta semana, foi demitido o presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb. Por escolha pessoal, também deixaram o Planalto Ricardo Kotscho e Frei Betto, assessores especiais de Lula, além de João Luiz Pinaud, titular da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos do Ministério da Justiça. A nova mudança esperada é a saída de Ana Fonseca, do Programa Fome Zero.