Título: Um conflito de raízes profundas
Autor: Khalil Shikaki
Fonte: Jornal do Brasil, 06/02/2006, Internacional, p. A9

O que conhecemos hoje como Palestina passou a ser assim designada em 63 a.C., ao ser incorporada ao Império Romano. Situada na margem oriental do Mediterrâneo, onde as vias comerciais e militares ligavam duas regiões do Oriente Médio ¿ de um lado, Egito, de outro, a Mesopotâmia (Iraque atual), ¿ ao longo dos séculos foi dominada e ocupada por diversos povos. Como não temer contar a história desse pedaço de terra que inspira sentimentos religiosos tão profundos, que por vezes se transformam em ações violentas? Com base em concepções e interpretações históricas, podemos entender como e por que um lugar chamado Palestina, sagrada para o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo, tornou-se o objeto do conflito entre palestinos e judeus. A Bíblia conta que os hebreus eram tribos seminômades que viviam em uma parte do deserto sírio. Sabe-se que migraram para o delta do Nilo no século XVII a.C., onde serviram os faraós durante séculos. Por volta de 1250 a.C., começaram a deixar o Egito ¿ a tradição judaica nos fala de um êxodo único, sob o comando de Moisés ¿, e reuniram-se gradativamente na ¿Terra de Israel¿ que, cinco séculos mais tarde, viria a ser tomada pelos assírios (722 a.C.) e o reino de Judá pelos babilônios (587 a.C.).

Ao final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), vencidos os turcos, a Palestina seria administrada pela Grã-Bretanha, por meio do ¿sistema de mandatos¿. Questão importante: em 1917, pouco antes, portanto, do final da primeira Guerra Mundial, os britânicos, através da Declaração Balfour, comprometeram-se com o Movimento Sionista (movimento nacional judaico visando a criação de um Estado) a criar ¿um Lar Nacional para o povo judeu¿ na Palestina, praticamente desprezando os direitos daqueles que já habitavam na região. Grandes deslocamentos de judeus ocorreram para a região, resultando em muitos choques com a população que lá se encontrava.

Outra questão que não pode ser esquecida é que milhões de judeus morrem durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Essa tragédia foi decisiva para que a causa do sionismo ¿¿ se tornasse amplamente aceita. Ao final da guerra, em 1947, a ONU aprova o Plano de Partilha da Palestina, que prevê a criação de um Estado árabe e um Estado judeu, e a internacionalização de Jerusalém, cidade sagrada para os cristãos, os judeus e os muçulmanos. A criação do Estado de Israel foi proclamada no dia 14 de maio de 1948, oito horas antes do término do mandato britânico na Palestina. No dia seguinte, tropas dos países árabes vizinhos invadiram a Palestina, dando início a um conflito armado. Além desse conflito, denominado de ¿guerra de independência¿ pelos judeus e pelos árabes, outros três conflitos militares de monta acontecerão na região: em 1956, a Crise de Suez; em 1967, a Guerra dos Seis Dias, e, em 1973, a Guerra do Kippour.

Os Acordos de Oslo (1993) associados à paz celebrada entre Israel e Egito (1978-1979) e Israel e Jordânia (1994), diminuíram o nível de tensão, mas não resolveram o problema. Que continua longe de ser contornado.

A eleição do Hamas é mais uma peça histórica: um partido radical assume o controle da Autoridade Nacional Palestina. E no Ocidente, o presidente George Bush, radical à sua maneira, deseja fazer descer, goela abaixo, a democracia em regiões hostis aos Estados Unidos, provocando assim a ira contra si e a antipatia contra o país que preside.

Não existe clima no momento para se vislumbrar a possibilidade de diálogo na região. Que o futuro nos surpreenda.