Título: Indústria critica acordo com Argentina
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Fonte: Jornal do Brasil, 03/02/2006, Economia & Negócios, p. A19
Para setor, adoção de salvaguardas por país vizinho prejudica produção nacional e levará Mercosul a retrocesso
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) criticaram ontem o acordo fechado pelos governos do Brasil e da Argentina que prevê a adoção de um mecanismo de salvaguardas no comércio bilateral. Esse mecanismo era reivindicado há mais de um ano pela Argentina, que alegava a necessidade de contar com um instrumento para proteger a indústria local contra a ''invasão'' de produtos brasileiros, como eletrodomésticos, autopeças, têxteis e calçados.
O Mecanismo de Adaptação Competitiva (MAC) poderá ser adotado caso um determinado setor comprove que as importações do país vizinho prejudicam a produção e não consiga costurar um acordo privado. As cotas aplicadas pelo país prejudicado poderão vigorar de um a três anos, podendo ser prorrogado por mais um ano.
- O mecanismo contraria o espírito da integração do Mercosul e gera um clima de retrocesso no desenvolvimento do bloco - disse o presidente da CNI, Armando Monteiro Neto.
Segundo ele, o acordo deixou de atender a várias recomendações do setor produtivo brasileiro, que defendia, por exemplo, a adoção de um mecanismo de natureza transitória.
Segundo Monteiro, o ''Mercosul é um ativo a ser preservado, não somente pelo seu caráter estratégico, mas, sobretudo, pelo componente econômico''.
Já a Firjan emitiu nota manifestando ''inconformidade com o acordo bilateral''.
''Desde 1999, o governo argentino vinha postulando este tipo de proteção à sua indústria. O governo brasileiro sempre se recusou a aceitar este procedimento que representa um dano irreparável ao Mercosul, pois permite que uma parte revogue unilateralmente dispositivos de livre comércio, pilar do acordo''.
Para o presidente do Conselho de Relações Internacionais da Firjan, Luiz Felipe Lampreia, a adoção do mecanismo permite que o governo argentino tenha instrumentos de ação para simular um dano não existente, impondo unilateralmente sobretaxas e cotas, impedindo a entrada de produtos brasileiros em regime de urgência.
''Todo fundamento da imposição de salvaguardas é permitir uma proteção temporária de uma indústria à concorrência externa, mas exigindo medidas que permitam voltar à liberdade de comércio em prazo definido e breve. No caso, porém, há regras tênues e metas imprecisas de adaptação competitiva, o que permite crer que a intenção é perpetuar os obstáculos aos produtos brasileiros'', comenta a Firjan, na nota.
A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) já havia criticado na quarta-feira o acordo, também enxergando nele ameaças ao Mercosul. ''(O acordo) é um passo atrás no processo de integração, contrariando a letra e o espírito do Mercosul''.
Para a entidade, o acordo não resguarda os interesses da indústria brasileira. Entre as críticas, estão a não-inclusão de dispositivos que revogassem imediatamente a aplicação do MAC em caso de desvio de comércio; que limitassem a vigência das salvaguardas a um ano; e que exigissem um mínimo de 50% de representatividade setorial para abertura de uma investigação, de acordo com os padrões adotados pela OMC, contra 35% do MAC.