Título: Vale tudo nos estados
Autor: Josie J., Juliana R., Rodrigo Camarão e Sérgio P.
Fonte: Jornal do Brasil, 05/02/2006, País, p. A2

BRASÍLIA - O fim da verticalização - regra pela qual as coligações partidárias nos estados deveriam seguir a coalizão nacional - legitimou o vale-tudo das alianças em todo o país. Hoje, o cenário que se desenha aponta para uma miscelânea partidária, de combinações exóticas e acordos impensáveis. A reunião no mesmo palanque de legendas de matizes e campos ideológicos diametralmente opostos chancelam a promiscuidade das coligações na maioria dos estados. No xadrez das alianças não há espaço para discriminação. Não importa se o parceiro no estado é inimigo mortal no plano nacional. Se a intenção é fortalecer o palanque para alcançar o triunfo nas urnas, o pragmatismo ecoa mais alto.

Em capitais como Acre e Alagoas , PT e PSDB, antagônicos na disputa pelo Palácio do Planalto, podem estar na mesma coligação. No Distrito Federal e na Bahia, o PSDB pode ter como adversário o PFL, provável parceiro na disputa pela sucessão de Lula. Em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, o PFL ameaça rachar com os tucanos para conquistar o governo do estado.

A cientista política Lúcia Hipólito defende o fim da camisa-de-força que é a verticalização. Para ela, a medida imposta em 2002 foi um desprezo à lógica regional e ao federalismo brasileiro.

O professor da Universidade de Campinas, especialista em ética na política, Roberto Romano, discorda. Ele argumenta que o sistema estimula a tentativa de controle regional para chegar ao governo federal e atrair recursos para currais eleitorais.

- Se o Brasil fosse, de fato, uma república federativa, a liberação das alianças seria interessante, mas não é o caso. As alianças indiscriminadas favorecem as oligarquias regionais e partidos com maior número de caciques, como PFL e PMDB.

O palanque em Sergipe é um caso emblemático de vale-tudo eleitoral. No estado, o prefeito Marcelo Déda, candidato do PT para o governo, pode reunir nada menos que o PSDB e PMDB.

Lula e o PT sonham com a reeleição mas perseguem objetivos opostos em estados como Santa Catarina, Paraná, Maranhão e Amazonas. No Maranhão, o presidente está com dificuldade de montar palanque. Quer apoiar a senadora Roseana Sarney (PFL), líder absoluta nas pesquisas de intenções de voto e excelente puxadora de apoio do eleitor. Terá de enquadrar, porém, o PT, que hesita entre a candidatura própria e o apoio ao governador José Reinaldo Tavares, ex-aliado e atual inimigo da família Sarney.

O lançamento de candidatura própria nos estados, mesmo sem chances de vitória, tornou-se importante para os partidos com a cláusula de barreira. As campanhas para governador servem de puxador de votos para as eleições proporcionais: de deputados federais e estaduais. Muitas coligações já desenhadas só serão oficiais no segundo turno. É o caso do Rio Grande do Sul, onde o PSDB - historicamente aliado do PMDB - lançará a deputada federal Yeda Crusius, já admitindo a coligação no segundo turno.

Em Alagoas, o apoio do presidente do Congresso, senador Renan Calheiros, a Teotônio Vilella Filho (PSDB) pode produzir uma situação hoje impensável nacionalmente com PSDB, PMDB e PT fazendo parte da mesma coligação. Se os três partidos tiverem candidato próprio à Presidência, ninguém sabe ainda como todos serão acomodados no mesmo palanque. O principal adversário é o PDT do governador Ronaldo Lessa.

Mesmo que o PMDB mantenha a candidatura própria à Presidência, vai oferecer palanque para o presidente Lula em vários estados, como Paraná e Santa Catarina. O presidente do partido, Michel Temer, admite a aliança com o partido que estará trabalhando pela reeleição.

- As coligações são feitas de acordo com as características regionais. Esperamos o apoio do PT para a reeleição de Roberto Requião, no Paraná - disse.