Título: Lula prejudica a auto-suficiência
Autor: Sergio Ferolla e Paulo Metri
Fonte: Jornal do Brasil, 09/02/2006, Opinião, p. A7

Consta que algumas tribos indígenas brasileiras, na época do seu contato com os brancos, não sabiam que o nascimento de uma criança era conseqüência de um ato sexual ocorrido cerca de nove meses antes. Lemos nos jornais que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer colocar como um dos carros-chefe de sua campanha para a reeleição, a conquista da auto-suficiência no abastecimento de petróleo do país, conseguido pela Petrobras, que merece elogios por esse feito. Contudo, de forma análoga à ingenuidade dos indígenas, não se está entendendo que a auto-suficiência parida nesse momento foi concebida muitos anos antes. Um campo de petróleo, desde a sua avaliação até começar a produzir, requer cerca de cinco anos para sua implantação, o chamado período de desenvolvimento. Para uma ocorrência de petróleo em uma área ter a sua comercialidade declarada e para o respectivo campo ser avaliado, demora meses ou anos. Em uma área recém concedida, para que ocorra uma descoberta precisam ser feitos levantamentos sísmicos e a análise dos dados obtidos, assim como perfurações iniciais, que também são atividades consumidoras de tempo.

Por tudo isso, a auto-suficiência que está se materializando, no momento, foi conseguida graças a descobertas de diversas épocas, tendo a quase totalidade ocorrido quando imperava o monopólio estatal do petróleo, em nosso país. E não é mérito do presidente Lula ter continuado a desenvolver campos anteriormente descobertos, pois teria sido o cúmulo, se esses desenvolvimentos tivessem sido paralisados, enquanto o país ainda estava importando petróleo.

Com a privatização e desnacionalização do subsolo nacional, ocorrida com a aprovação da Lei no 9.478, em 1997, uma parte desse subsolo foi entregue, através das sete rodadas de licitações de áreas da ANP, promovidas pelos governos Fernando Henrique Cardoso e Lula, a empresas estrangeiras que irão exportar o petróleo a ser descoberto, portanto, não ajudando a abastecer o país e, ainda mais, prejudicando a auto-suficiência futura. O Brasil não tem petróleo como a Arábia Saudita e, assim, o petróleo exportado fará falta, mais à frente, para o abastecimento interno.

Se alguém alegar que, nos contratos de concessão assinados entre a ANP e as empresas estrangeiras, existe cláusula de abastecimento interno, trata-se de um desavisado ou um mal intencionado, porque essa cláusula só garante para o país o petróleo necessário para 30 dias, enquanto deixa escoar para o exterior, no mesmo período, aquele necessário para meses e anos futuros.

Dessa forma, os governos FHC e Lula conseguiram, na realidade, foi diminuir o período de auto-suficiência, graças à entrega do subsolo nacional a estrangeiros que irão levar para o exterior nosso petróleo descoberto. Aliás, o presidente Lula, com a oitava rodada de licitações programada para o presente ano, irá igualar a marca do presidente FHC, qual seja, quatro rodadas em um mandato, e dessa forma, estará contribuindo em igualdade de condições com seu antecessor para diminuir o período de auto-suficiência nacional de petróleo. Sugerimos ao presidente Lula buscar outro carro-chefe para sua campanha visando a reeleição, senão o tiro pode sair pela culatra.

Sergio Ferolla, Tenente-Brigadeiro-do-Ar, é membro acadêmico da Academia Nacional de Engenharia. Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia.