Título: Esperança de campanha
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 05/02/2006, Opinião, p. A9

Com a ansiedade habitual de quem historicamente enxergou no presidente da República o homem providencial, milhões de brasileiros esperam a escolha dos partidos para saber quais candidatos enfrentarão nas urnas Luiz Inácio Lula da Silva. Dispostos a recuperar o poder exercido durante oito anos, os tucanos examinam os nomes de Geraldo Alckmin e José Serra. O PMDB discute se opta pelas candidaturas de Anthony Garotinho ou Germano Rigotto, ou ainda se atende a eventuais ambições do ministro Nelson Jobim, presidente do Supremo Tribunal Federal, ou do senador Renan Calheiros para figurar numa chapa com o PT. Independentemente dos desdobramentos do xadrez partidário, as perspectivas para o nível político da campanha presidencial de 2006 são desanimadoras. O pessimismo reflete o que os partidos e pré-candidatos exibiram até aqui. Depois de meses sucessivos de crise política, resultado do maior escândalo já constatado no país, a corrupção será, provavelmente, o principal tema da campanha. Não à toa o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deu a palavra de ordem para a estratégia do PSDB: atacar a ''ladroagem''.

O ex-presidente apóia-se em pesquisas segundo as quais os eleitores acreditam que a solução para os problemas de corrupção não está na Justiça, na população ou na legislação. A saída para o país livrar-se dos pilantras federais, acreditam os brasileiros, está nas mãos dos próprios políticos. Conjugados com a fartura de imagens e informações de delúbios, valdemares e jeffersons, é possível antever o que predominará na propaganda eleitoral. O risco não está na insistência do assunto. O Brasil precisa expurgar da política traquinas dispostos tão-somente a assegurar os próprios interesses.

O perigo é bem maior: partidos e pré-candidatos apresentaram até agora pouco mais do que bravejos estéreis. A oposição tem-se concentrado em atacar o PT, mostrar a distância entre o discurso do passado e a prática quando no poder, além de sublinhar as ruidosas denúncias que esfacelaram o patrimônio ético do partido. A campanha governista fixou-se até aqui nas realizações da administração.

Nem oposição nem situação chegaram a mostrar o que farão para evitar que novos mensalões se repitam nos corredores de Brasília. Não discutiram, por exemplo, se eliminarão o extraordinário número de cargos de confiança, tampouco revelaram como estancarão o dinheiro que escorre entre os mundos público e privado. O Brasil deseja que o façam até a eleição. Espera também que a campanha não repita equívocos do passado, em que fantasias ilimitadas alimentaram a esperança dos eleitores e provocaram a frustração de milhões de brasileiros.

O que farão para romper o ciclo de crescimento econômico modesto? Como oferecerão mais segurança para os cidadãos? De que modo será possível apressar a redução da desigualdade de renda? É possível criar mais empregos do que fizeram os governos FH e Lula? Sobre tais questões os eleitores devem debruçar-se e cobrar respostas detalhadas de seus candidatos. Sem tardança, o Brasil haverá de descobrir o poder do voto e aprender a utilizá-lo como real instrumento de luta.

A campanha presidencial deste ano oferecerá uma nova oportunidade para o eleitor demonstrar que tem condições de romper com um de seus traços bisonhos: a tendência para a capitulação diante dos inimigos mais perseverantes. E os inimigos, hoje, podem ser representados por um bandido disfarçado ou por um salvador da pátria, enunciador de promessas sem limites. Convém rejeitar ambos.