Título: Ahmadinejad, o homem a quem teme o Ocidente
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Fonte: Jornal do Brasil, 05/02/2006, Internacional, p. A14

Um iraniano aponta para um alto-relevo milenar em Persépolis e explica que as figuras esculpidas são armênios. ¿ Levam presentes para o rei do Irã, há 2.500 anos. Agora ¿ afirma ¿ têm usina nuclear.

Mais à frente, aponta para um outro afresco.

¿ São da Índia, não tinham nem sapatos e também já têm usinas nucleares ¿ acrescenta, abrindo os braços para as ruínas da cidade fundada por Dario, o Grande, em 518 d.C. na antiga Pérsia. ¿ Olhe para essa civilização. Porque George Bush acha que pode nos dizer o que fazer?

A introdução mostra porque, desde que a figura pequena de Mahmoud Ahmadinejad assumiu a presidência do Irã, em junho de 2005, o mundo soluça a cada discurso em Teerã. Montado no sonho de levar uma das civilizações mais antigas do planeta ao clube atômico, o presidente galvanizou a atenção de 70 milhões de iranianos com a imagem erguida a partir das ruínas do nacionalismo destroçado em 1953, com a estrutura messiânica dos fundamentalistas. Graças a isso, hoje, diferenças de educação, idade e sobretudo quanto a um governo ultraconservador deixaram de existir. O primeiro presidente não clérigo em 24 anos é também o mais popular e o mais carismático. Não à toa, diz liderar uma ¿revolução islâmica que alcançará, um dia, o mundo inteiro¿. Parece, por isso mesmo, gostar do fato de o Conselho de Segurança das Nações Unidas estar a um passo de aplicar sobre o país, graças ao desafio nuclear, as sanções que costumam ser arautos da guerra.

Mahmoud Ahmadinejad nasceu em 28 de outubro de 1956, em Garmsar, Norte do Irã. Era o terceiro entre sete filhos de um metalúrgico e veio ao mundo três anos depois que um golpe de Estado organizado pelos EUA e pela Grã-Bretanha apeara o então primeiro-ministro Mohammad Mossadegh. O motivo? Querer justamente o que o atual presidente procura: independência energética e autonomia política. Nos anos 50, enquanto a família emigrava para Teerã, a nacionalização do petróleo e da refinaria de Abadan, virtual propriedade de Sua Majestade desde 1908, era um sonho sepultado à força. Na atualidade, ressurgiu na luta pela conclusão da usina atômica de Busheir.

Ahmadinejad, o 130º colocado no vestibular nacional para a universidade, é engenheiro civil com doutorado em planejamento de tráfego. Foi professor na principal universidade politécnica de Teerã. O título foi obtido em 1987, no mandato como governador da província de Ardabil. Oficial da Guarda Revolucionária, não esconde suas intenções. O Ocidente enxerga o projeto como um passo rumo às bombas nucleares, mas nada disso intimida um homem doutrinado pela Revolução Islâmica antes que ela tomasse o poder, em 1979.

O ex-prefeito de Teerã ¿ cuja administração populista angariou muitos votos ¿ foi um dos estudantes fundadores do Office for Strengthening Unity, grupo que invadiu a embaixada dos EUA em Teerã, no mesmo ano, e manteve 66 reféns por 444 dias. Apesar de alguns dos seqüestrados terem-no reconhecido, nega ter sido carcereiro, ainda que sem ênfase. Sabe-se que, antes da invasão ao prédio dos EUA, Ahmadinejad havia proposto ação similar contra a representação da União Soviética. Foi voto vencido. O mistério em torno do presidente está até no site oficial do governo, onde a biografia remete apenas para um retrato. Não soa estranho para alguém que, tendo se incorporado na guerra contra o Iraque, se especializou em operações especiais em território curdo.