Título: Protestos matam seis pessoas
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Fonte: Jornal do Brasil, 07/02/2006, Internacional, p. A7

Três afegãos morreram e pelo menos outros quatro ficaram feridos no Leste do Afeganistão durante uma manifestação contra a publicação de caricaturas do profeta Maomé, iniciada com um jornal dinamarquês em setembro de 2005. A polícia atirou para o alto e pelo menos cinco pessoas ficaram feridas pelos tiros tentando dissolver a multidão com 5 mil pessoas em Mihtarlam, capital da província de Laghman, no Afeganistão. Houve confusão também no Leste da África, sobretudo na Somália, onde um manifestante foi morto, e em Djibuti, onde o governo proibiu as importações dinamarquesas em sinal de represália. Em Teerã, 200 pessoas tentaram invadir as embaixadas da Dinamarca e da Áustria, atacando os prédios com coquetéis molotov. A polícia deteve o grupo, mas o governo iraniano anunciou o rompimento de relações comerciais com o governo dinamarquês. Os ânimos estão mais acirrados porque este é o período do ano mais sagrado para os xiitas, que relembram o martírio do imã Hussein, neto de Maomé.

A confusão gerada pelas charges também respingou na própria União Européia, presidida pela Áustria, onde a falta de ação tem sido bastante criticada. Vários líderes pediram que a UE reagisse a ataques violentos como o ocorrido em Beirute em bloco, e não individualmente, como vinha ocorrendo. O agravamento das tensões levou à convocação de reunião de emergência em Bruxelas.

- Essa é uma crise muito maior que a Dinamarca - cobrou, de Copenhagen, o ministro das Relações Exteriores Per Stig Moller. - Trata-se de um ataque à cooperação entre o Ocidente e o mundo islâmico e nada temos a ganhar com a confrontação - cobrou, acrescentando que há muito a perder porque ''a situação está nas mãos de fanáticos que odeiam o diálogo entre as culturas''.

O apelo de Moller faz sentido principalmente em função da decisão do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, de suspender os negócios com o país nórdico. O prejuízo é calculado em US$ 280 milhões. Além disso, o governo de Teerã anunciou a criação de uma comissão para estudar aplicação de medidas semelhantes em todos os países nos quais as charges foram republicadas. No ataque em Teerã, a preocupação da polícia era a de evitar sanções em função dos estragos.

- Não provoquem danos, o governo terá de pagá-los! - gritavam os policiais por alto-falantes.

A atuação da Áustria também foi comentada pelo presidente da Alemanha, Horst Koehler. Dizendo falar em nome dos colegas da Finlândia, Itália, Letônia, Portugal e Hungria Kohler afirmou que ''ameaças e violência são inaceitáveis sob qualquer circunstância''. Em manifestações na Grã-Bretanha, muçulmanos ameaçavam com decapitação os responsáveis pela reprodução das charges sobre Maomé. Embora não sejam incomuns no mundo árabe, as representações do profeta são proibidas pelo Corão. Diante da pressão, governo austríaco recuou.

- É importante que falemos sob uma só voz dentro da União Européia, ao mesmo tempo reforçando os nossos valores comuns e fazendo um esforço em torno do abrandamento dos ânimos - concordou o presidente austríaco, Heinz Fischer.

O secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, bateu na mesma tecla, pressionando as autoridades muçulmanas a retomarem o controle das manifestações:

- Exorto a todos que podem influir ou tenham poder nas diferentes comunidades a se engajarem no diálogo e na construção de uma aliança real de civilizações, baseada no respeito mútuo - pediu.

Em Beirute, pelo menos 300 pessoas foram presas pelos distúrbios de domingo, quando o consulado da Dinamarca na cidade foi incendiado. Os manifestantes atacaram também igrejas, lojas, bancos e veículos. Pelo menos uma pessoa morreu e 50 ficaram feridas. O governo local pediu desculpas aos dinamarqueses pelo ocorrido.