Título: Candidato critica missão da ONU
Autor: Sheila Machado
Fonte: Jornal do Brasil, 07/02/2006, Internacional, p. A9

Na véspera das eleições presidenciais no Haiti, o segundo colocado nas pesquisas de intenção de voto, Henri Baker, criticou as tropas da missão de estabilização da ONU (Minustah), lideradas pelo Brasil. Para Baker, os comandantes são ''tolerantes demais''.

- É criminoso não tomar conta do problema em Cité Soleil. Como eles podem manter de 200 mil a 300 mil terroristas colocando medo em 200 mil pessoas e não fazer nada a respeito? - indagou.

Cité Soleil, uma favela no Norte de Porto Príncipe, é considerada o principal reduto de criminosos na capital. Apesar de o presidenciável reclamar que as tropas ''não fazem nada'', freqüentemente há troca de tiros entre os capacetes-azuis, principalmente os brasileiros, e as gangues.

Baker pleiteia que a única forma de vencê-las é entrar na favela com uma ''força avassaladora'', usando tanques e helicópteros, como fizeram os americanos logo após a queda do presidente Jean-Bertrand Aristide, em 2004.

- Eles deveriam perguntar aos fuzileiros navais americanos como entraram lá sem matar uma só pessoa e em três horas restauraram o domínio da lei em Cité Soleil. Talvez aprendam alguma coisa - criticou.

Como o pleito é hoje e vários dos mais de 3 milhões de eleitores já estão intimidados pelos grupos armados ligados ao Lavalas - o partido de Aristide -, a Minustah preferiu não fomentar a polêmica.

- Estamos fazendo nosso trabalho. Os candidatos buscam votos de última hora - disse o porta-voz da missão, David Wimhurst, em entrevista ao JB por telefone, de Porto Príncipe.

Ontem, foi feriado no Haiti. Apesar do temor de que haja episódios de violência contra os eleitores hoje, o clima era de calma em todo o país, inclusive em Porto Príncipe, contou Pierre Espérance, diretor-executivo da organização Réseau National de Défense des Droits Humains.

- Não registramos episódios violentos motivados por política. No domingo, fui a Cité Soleil e lá também estava tudo tranquilo. Não percebemos atividades das gangues, os moradores estavam relaxados, conversando em frente às suas casas. E acreditam que a jornada eleitoral transcorrerá no mesmo clima - revelou.

Para evitar ou lidar com eventuais problemas de segurança, a Minustah mobilizou todo o seu contingente de quase 9 mil homens. E segundo Wimhurst, os capacetes-azuis estão confiantes.

- Estão todos muito bem dispostos, treinados e prontos - garantiu. - Acreditamos ainda que o trabalho de estabilização ficará mais fácil depois do pleito, uma vez que o ambiente político vai mudar com um governo democraticamente eleito. Essa administração pode aprovar os programas de desenvolvimento para reeguer o país.

Além da violência, um ponto que preocupa é a superlotação de certas zonas eleitorais. Por causa de confrontos com gangues, os funcionários do Conselho Eleitoral Nacional (CNE) não conseguiram instalar seções em Cité Soleil. Os moradores da favela foram transferidos para outros locais de Porto Príncipe.

- O CNE colocou muita gente para votar num lugar só. Esperamos ter muitas filas, longas e vagarosas - estimou Espérance.

Outro problema pode ser a instabilidade causada pela demora na divulgação dos resultados, previstos para daqui a três dias.

- Não sabemos como o CNE vai lidar com os números parciais, se vai liberá-los ou não. A falta de informação pode gerar desconfiança de problemas técnicos e, entre os mais radicais, de fraude - advertiu o ativista haitiano.

Sanar as dúvidas nessa questão será tarefa das centenas de observadores internacionais. O Brasil enviou três deputados, um senador e integrantes da da Divisão de América Central do Itamaraty.

O franco favorito para se tornar presidente é o ex-presidente Rebé Preval, seguido de longe pelo empresário Baker, o também ex-líder Leslie François Manigat e Guy Philippe, ex-comissário de polícia. Este último comandou a convulsão social que derrubou Aristide.