Título: À frente do PMN, político de 90 anos rejeita rótulos
Autor: Josie Jeronimo
Fonte: Jornal do Brasil, 12/02/2006, País, p. A4
O mineiro de Cambuquira olha para o céu, aponta o Cristo Redentor e agradece: ''Estou embaixo da mão direita dele''. Doce, mas de temperamento vivaz, ele adentra à casa em que mora, no bairro da Lagoa, no Rio, há mais de 50 anos e mostra a coleção de xícaras da mulher. Dá a receita da felicidade: ''Quem se casa em Cambuquira, fica junto por muito tempo''. Sessenta anos de casado e até hoje um apaixonado. A cada dez frases, em uma menciona a mulher. Para fazer o político de 90 anos ficar bravo basta perguntar sobre a fama que assombra as pequenas legendas: o aluguel. O advogado Oscar Noronha Filho é o presidente da legenda mais idoso do Brasil e defensor enérgico dos preceitos éticos do PMN (Partido da Mobilização Nacional).
Perde a fala mansa, levanta a voz e com dedo em riste avisa: a legenda não está aberta a estrategistas. Alega que a reforma eleitoral levou a legenda a buscar novos integrantes. A exigência de representação fez com que o pequeno partido fosse atrás de políticos com capital eleitoral próprio. Oscar conta que as dificuldades da sigla são tantas que muitas vezes falta dinheiro até para postar correspondência.
- Nós nunca fomos muito interessados em cargos eletivos. Agora somos forçados a isso. Se não tivermos cinco deputados federais perdemos o fundo partidário.
No Rio, o partido abriga dois secretários do governo do estado. Aliados do ex-governador Anthony Garotinho (PMDB), o suplente de deputado federal Fernando Willian, titular da pasta de Família e Assistência Social, e Christino Áureo, de Agricultura e Abastecimento, entraram para o PMN com o objetivo de disputar cargos este ano. Apesar de entender a importância da sigla para Garotinho, Noronha diz não morrer de amores pelo peemedebista.
- Garotinho tem métodos um pouco estranhos para o meu gosto. Ele não tem ética cem por cento. E quem não é cem por cento honesto já é desonesto.
Para mostrar que não está brincando, lembra o episódio em que o partido expulsou o prefeito interino de São Paulo, Régis Oliveira. Quando o ex-prefeito Celso Pitta foi afastado do cargo, Régis assumiu o lugar. Ocupar interinamente o comando da maior cidade do país foi a maior conquista da legenda, que hoje não tem nem mesmo um deputado na Câmara. Assim mesmo, o partido o expulsou por duvidar da sua conduta à frente do município. Permanecer sem representantes em Brasília também foi um golpe para o partido.
- O ex-ministro José Dirceu roubou o único deputado que tínhamos e deu de presente para o Roberto Jefferson , para engrossar o PTB - acusa, referindo-se a Jackson Barreto (SE). O deputado, por sua vez, afirma que deixou a legenda, porque encontrava dificuldades em permanecer ''sozinho'' na Casa.
O fundador do PMN balança a cabeça, aguça os sentidos e viaja até a década de 70, para um época em que a a expansão da liberdade política era um desejo ardente. Critica a atual ''democracia de cotas'', em que a proporcionalidade vale mais que as idéias. Conta como foi seu primeira e única experiência.
- Minha mulher ficou com uma carteira de 35 mil clientes no escritório dela de advocacia, depois que ganhou uma ação trabalhista. Para aproveitar essa clientela, sugeriram que eu saísse candidato em 1964. Concorri pelo PTB e fui deputado com apenas 484 votos, como suplente de Leonel Brizola - disse, batendo no peito com orgulho por ter sido cassado como subversivo.
A mulher, a advogada Leda Maria Albuquerque Noronha, sempre dividiu o amor pela política com o marido. Com uma vida dedicada às questões públicas, Oscar é um dos poucos que não recebeu retorno financeiro pela atuação política. Formado em Direito, nunca advogou. Hoje vive com a aposentadoria de R$ 1 mil como técnico de administração. Antes, a pensão era de R$ 300. Só conseguiu aumento depois de pedir equiparação com a função de gari.
- Aos 86 anos, a minha mulher continua ganhando o pão de cada dia Eu só tenho essa mísera aposentadoria.