Título: A arte de fazer uma campanha parecer modesta
Autor: Juliana Rocha
Fonte: Jornal do Brasil, 12/02/2006, País, p. A5

O projeto de lei elaborado para reduzir custos de campanha nas eleições deste ano promete efeitos colaterais graves. Os partidos já começaram a seduzir os marqueteiros, para convencê-los a fazer campanhas simples aos olhos dos eleitores escaldados com o escândalo do caixa dois. Sem fiscalização, porém, o que parece barato pode sair tão caro quanto o espetáculo hollywoodiano que marcou as campanhas de Lula e José Serra em 2002, comandadas por Duda Mendonça e Nizan Guanaes, respectivamente.

Se a lei vingar, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e os tribunais regionais precisarão aumentar a equipe para acompanhar a produção dos programas do horário gratuito no rádio e na TV e o tamanho do staff que cerca os políticos. Estes são os principais indicativos do volume de dinheiro que circula nos comitês partidários. A regra obrigará a fiscalização de brindes e showmícios, que pouco representam nas despesas do candidato. Po sugestão do TSE, a Receita e a Polícia Federal poderiam ajudar, mas a proposta esbarrou na resistência de partidos como o PFL.

- Os profissionais que trabalham na campanha podem se adequar a qualquer teto, afinal, na iniciativa privada, as empresas tem um orçamento. Difícil vai ser os políticos se adaptarem ao limite. Mais difícil vai ser controlar estes gastos, principalmente nas alianças partidárias - destaca o publicitário Paulo de Tarso, responsável pelas campanhas do PT em 1989 e 1994.

O texto básico da lei que reduz os custos de campanha proíbe brindes e comícios com artistas - os showmícios. Nesta semana, será votada a regra de prestação de contas a cada 30 dias pelo site do TSE. Este ponto e outras 40 emendas esbarraram na resistência dos partidos. Já o limite de gastos será estabelecido pelo Congresso até 10 de junho. Se o Legislativo não chegar a um consenso, a responsabilidade será do Tribunal Superior Eleitoral.

O deputado Moreira Franco (PMDB-RJ), relator do projeto, está otimista, mesmo sabendo que a proposta pode ser esvaziada na Câmara e quando voltar ao Senado.

- A resistência maior é de quem faz campanha com muito dinheiro. Não querem prestar contas pela internet, mas acho que o projeto não sofrerá muitas mudanças - diz.

Nas eleições de 2002, os principais candidatos contavam com equipes de comunicação de até 80 profissionais. Eles faziam assessoria, pesquisas e colhiam informações para produzir o horário eleitoral que mais agradasse ao público.

Calcula-se que os marqueteiros consumiram 60% da arrecadação de campanha política, incluindo a equipe e toda a produção. A campanha de Lula declarou despesas de R$ 21 milhões, mas Duda Mendonça admitiu à CPI dos Correios ter recebido somente do dinheiro não declarado R$ 10 milhões, depositados em uma conta no exterior.

Um dos colaboradores de José Serra em 2002 calcula que, reduzindo ao máximo os custos, somente a propaganda no rádio e na TV deve sair por R$ 5,5 milhões. Isto, mesmo fazendo uma campanha que pareça modesta. O valor pagaria desde a coleta de informações até a finalização do programa. Ele soma, ainda, R$ 1 milhão para pesquisas de opinião, que não saem por menos de 60 mil cada, com um universo de 2 mil entrevistados.

Um outro marqueteiro, que já foi sondado pelo PT para a campanha deste ano, pela experiência com 30 eleições, incluindo três nacionais, calcula que o orçamento da propaganda eleitoral gratuita - excluindo a assessoria de comunicação - é de R$ 6 milhões a R$ 7 milhões. Ele comenta que quem declarar menos estará tentando maquiar um custo muito mais elevado.

Fazer a propaganda eleitoral gratuita mais barata é possível com a contratação de produtoras que ainda não circulam no mercado de ouro dos políticos. O produtor Gabriel Araújo elaborou um orçamento de R$ 30,8 mil para um programa de dez minutos, sem incluir o roteiro e a coleta de informações prévias. Em uma grande produtora, o mesmo programa é orçado em R$ 200 mil.