Título: Dívida de cliente garante recorde
Autor: Rafael Rosas
Fonte: Jornal do Brasil, 15/02/2006, Economia & Negócios, p. A17

Estimulados pela expansão do crédito ao consumidor, juros e tarifas, os ganhos dos grandes do setor devem crescer sete vezes mais que a inflação em 2005

O Unibanco inaugura amanhã o que promete ser uma temporada de recordes para o setor bancário. Na esteira da explosão do crédito, das altas taxas de juros, das receitas com tarifas e dos cortes de custos, analistas estimam em até 40% o crescimento dos lucros dos grandes bancos brasileiros em 2005, sete vezes mais que a inflação acumulada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no ano passado, de 5,69%. Para se ter uma idéia de quanto 2005 foi rentável para as instituições bancárias, basta analisar os recentes resultados de Bradesco, Itaú, Banco do Brasil e Unibanco. Durante todo o ano de 2004, o lucro somado dos quatro foi de R$ 12,30 bilhões. No ano passado, levando em conta apenas os resultados até setembro, a soma atinge R$ 12,62 bilhões.

A expectativa é de que o ranking dos lucros do setor seja liderado pelo Bradesco, seguido de perto pelo Itaú. Para Erivelto Rodrigues, presidente da Austin Rating, os dois se beneficiam por ser as duas principais instituições de varejo do país, gerando ganho a partir de uma maior expertise em emprestar dinheiro ao consumidor.

Para ele, o Bradesco, que apresenta o seu resultado na semana que vem, deve lucrar R$ 5,5 bilhões, mais de 80% acima dos R$ 3,06 bilhões de 2004. Na segunda-feira, segundo Rodrigues, o Itaú deve anunciar lucro em torno de R$ 5,2 bilhões, contra R$ 3,78 bi no ano anterior. A seguir, segundo o executivo da Austin, virá o Banco do Brasil, com R$ 4,8 bilhões.

Os lucros bancários saltam aos olhos quando comparados a importantes empresas do setor produtivo nacional. As estimativas da Austin Rating ficam bem acima dos ganhos de R$ 3,245 bilhões registrados pela Gerdau em 2005. Na frente dos bancos, só mesmo as gigantes Petrobras e Vale do Rio Doce, que nos nove primeiros meses do ano passado lucraram R$ 15,6 bilhões e R$ 7,8 bilhões, respectivamente.

E a principal razão para o lucros estratosféricos é a explosão do crédito ¿ e do endividamento da população. João Augusto Frota Salles, economista da consultoria Lopes Filho, lembra que nos 12 meses terminados em novembro de 2005 o crescimento acumulado do crédito à pessoa física era de 38,8%. Colocando no cálculo a pessoa jurídica, a conta recuava para 25,2%.

Erivelto Rodrigues, da Austin, acredita que o crédito vai continuar crescendo este ano, embora num ritmo menor. A desaceleração deve refletir nos lucros, que para ele deverão crescer ¿módicos¿ 18% em 2006.

Salles, da Lopes Filho, enxerga, no entanto, outros fatores importantes na alta dos lucros. Ele enfatiza que os elevados patamares da taxa básica de juros seguem garantindo bons rendimentos para os bancos, apesar da redução da Selic de 19,75% ao ano em setembro para os atuais 17,25%.

O analista enumera ainda duas razões mais custosas para clientes e funcionários. Segundo Salles, o controle dos custos operacionais, com a redução dos gastos com pessoal e a maior disseminação dos serviços pela internet, colaborou para um controle mais eficiente das despesas.

A outra razão para os fortes resultados é o crescimento da importância da receita com serviços.

¿ As tarifas, certamente, refletiram pesadamente no resultado ¿ resume Salles.

Estudo do Instituto de Ensino e Pesquisa em Administração (Inepad) mostra que as receitas com serviços ¿ entre os quais se encontram as tarifas bancárias ¿ geraram, de janeiro a setembro, receitas de R$ 5,33 bilhões para o Bradesco, R$ 5,64 bilhões para o Banco do Brasil, R$ 5,61 bilhões para o Itaú e R$ 2,42 bilhões para o Unibanco.

¿ As receitas com serviços foram maiores, subindo, em média, 20% nos grandes bancos do país, com destaque para Bradesco e Itaú ¿ diz Edson Carminatti, analista do Inepad.

Mas a maré não será tão positiva para os bancos menores. De acordo com Erivelto Rodrigues, da Austin, essas instituições sofreram com a falta de liquidez, principalmente depois da quebra do Banco Santos, que amedrontou muitos clientes.

Situação mais delicada ainda viveram aqueles que dividiram as manchetes com as Comissões Parlamentares de Inquérito que brotaram em Brasília em 2005. O Banco Rural, por exemplo, reduziu sua carteira de crédito de R$ 4,5 bilhões para R$ 1,7 bi, no rastro do escândalo de saques revelados pela CPI dos Correios.

¿ O Rural passou por dificuldades e está tentando se recuperar. Em 2005 fechará com prejuízo ¿ afirma Rodrigues.

Outro que teve a imagem arranhada foi o BMG. A instituição, no entanto, se saiu melhor e fechou 2005 com lucro de R$ 382 milhões e carteira de crédito de R$ 1,8 bilhão.

Mas os lucros astronômicos, o arrocho dos clientes com pesadas tarifas e os ganhos com os altos juros cobrados podem estar com os dias contados. Aguarda votação na Câmara dos Deputados o projeto que cria o Super-Cade, que passaria a ter, entre suas atribuições, a fiscalização da concorrência no setor bancário. A matéria ainda não tem data para ser votada.