Título: Favorito apóia manifestações
Autor: Sheila Machado
Fonte: Jornal do Brasil, 15/02/2006, Internacional, p. A15
Presidenciável Préval diz ter certeza que venceu no primeiro turno e denuncia que houve ''fraude maciça'' nas eleições
PORTO PRÍNCIPE - No dia em que o Conselho Eleitoral Provisório (CEP) prometeu que divulgaria o resultado final da eleição presidencial no Haiti, manifestantes voltaram às ruas para reclamar a vitória de René Préval, do partido Lespwa (Esperança). O clima era tenso, embora não tenham sido registrado casos de violência como na véspera, quando uma pessoa morreu e várias ficaram feridas em um tiroteio em Porto Príncipe. O próprio Préval alimentou a desconfiança de que a apuração não é transparente e declarou-se vencedor nas urnas, num movimento que pode fomentar os distúrbios.
- Tenho certeza que ganhei no primeiro turno. Temos a convicção de que fraudes maciças e erros grosseiros emperram o processo eleitoral - denunciou.
Pouco depois, fez um discurso para acalmar os ânimos de seus eleitores, destacando que ''todos têm o direito de se manifestar, mas respeitando a ordem''.
Nos primeiros dias de apuração, na semana passada, o ex-presidente aparecia liderando o pleito com mais de 60% dos votos, vantagem que caiu para 48,76% ontem, quando 90,02% dos sufrágios haviam sido computados. Esta cifra é mais do que o quádruplo do segundo colocado, Leslie Manigat (11,83%). Segundo o candidato, ele chegou a receber uma proposta para desistir do segundo turno, mas a recusou. Também sustenta ter chegado a um acordo com o líder das parciais para que ambos aceitem o resultado, ''qualquer que seja''.
Nas ruas, este consenso não existe. É por causa do forte respaldo que a população não entende porque Préval já não pode ser declarado presidente eleito, sem uma nova jornada eleitoral, em 19 de março, acredita o coronel Luiz Santiago, do contingente brasileiro da missão de estabilização da ONU (Minustah).
- A população está em suspense. Sabíamos que haveria uma certa dificuldade em entender o mecanismo do segundo turno, porque é um processo inédito no Haiti - afirma ao JB. - Os haitianos tendem a desconfiar que seja uma manobra de fraude. Logo, há manifestações de inconformismo.
Atendendo a uma demanda do Brasil, comandante da Minustah, o Conselho de Segurança da ONU pediu ontem que o povo e as lideranças políticas respeitem o resultado das urnas, impeçam a violência e trabalhem pela reconciliação nacional. O documento, firmado por 15 países, reiterou que o processo eleitoral ''foi transparente, conforme os padrões internacionais''. A vigência da Minustah foi prorrogada por mais seis meses - até 15 de agosto.
A declaração foi feita por John Bolton, embaixador na ONU dos Estados Unidos - país que ocupa atualmente a presidência do Conselho de Segurança. Mas não serviu para acabar com os protestos nas ruas de Porto Príncipe. A movimentação começou de manhã, ''depois de uma madrugada tranquila'', segundo o coronel Santiago. Milhares de pessoas se concentraram no bairro de Delmas, cantando ''Préval é presidente''. No centro, circulavam poucos veículos, por causa das barricadas. Nos arredores de Pétion-Ville, pedras e carcaças de carros foram colocadas no meio-fio das ruas, prontas para serem utilizadas como barreiras a qualquer momento.