Título: Cadê o processo do PT contra FH?
Autor: Augusto Nunes
Fonte: Jornal do Brasil, 14/02/2006, País, p. A2

O PT permanece internado desde julho de 2005 na UTI reservada a enfermos em estado gravíssimo. Atropelado pelo caminhão de Roberto Jefferson, o partido sobreviveu com fraturas generalizadas. Cambaleante, desviou-se da rota e acabou afundando no Pântano do Planalto. Recolhido ao Hospital da Base Aliada, continua a portar-se como menino rebelde. Em vez de tratar com coragem o câncer diagnosticado a olho nu, a turma da estrela estilhaçada refugiou-se em beberagens, remédios caseiros e pajelanças. Os sinais vitais seguem precariamente preservados, mas a alta - se vier - vai demorar bastante. Só o PT finge não notar que está mais para lá do que para cá. E tenta agir como quem desfruta do que Nelson Rodrigues chamaria de saúde de vaca premiada.

Quando a turma da enfermagem se distrai, o paciente turrão tira os tubos, ergue-se da cama, desliza até a janela mais próxima e já desembarca na rua de punhos cerrados, pronto para brigar. A imprensa reacionária, as elites conservadoras, a oposição golpista - qualquer adversário serve. Mas o inimigo preferencial será sempre o ex-presidente Fernando Henrique.

Para o PT, FH é o que Osama Bin-Laden representa para George Bush, ou um cartunista dinamarquês para os soldados do Islã, ou os EUA para os órfãos da União Soviética. É o Grande Satã. A síntese da História Universal da Infâmia.

Nas recentes fugas do hospital, o PT tem embarcado no mesmo repertório de frases desafiadoras que desembainhava antes de ter reduzido a farrapos o estandarte da ética na política. E vive prometendo reduzir FH a um mau sociólogo que se tornaria o pior dos políticos.

Devolvido ao leito, troca o berreiro pela voz ofegante de quem envelheceu precocemente. O jovem lutador das décadas de 80 e 90 lembra hoje um pugilista que sofreu golpes demasiados no fígado e na testa. Está sonado. Se não cuidar da convalescença, vai acabar no rabecão.

Há semanas, o brigão recém-saído do coma encarnou no presidente da Câmara, deputado Aldo Rebelo, companheiro de fé, a mais petista entre as ovelhas do rebanho do PCdoB. No tom plácido de quem provocaria motins num bingo que o incumbisse de cantar as pedras, Aldo avisou que desengavetaria a CPI das Privatizações. Ótimo, apoiou o coro dos decentes.

Há séculos o PT promete apurar bandalheiras ocorridas na transferência de empresas estatais para a iniciativa privada. Está mais que na hora de consumar a ameaça. Mas o assunto foi logo esquecido por Aldo - o comunista que a mais conservadora matrona de 1964 desejaria ter como genro.

Pouco mais de uma semana atrás, a entrevista concedida por FH à revista IstoÉ induziu o internado a repetir o espetáculo da escapada da UTI. ''A ética do PT é roubar'', bateu Fernando Henrique. Um santo guerreiro baixou no presidente do partido injuriado, Ricardo Berzoini. Decidido a ver reparada a ofensa intolerável, o companheiro jurou processar FH.

Se não jogou mais uma vez para a platéia, Berzoini está convidado a informar em que instância se encontra a ação penal movida contra o ex-presidente, revelar seu teor e antecipar os passos seguintes. Advogado é que não falta ao partido. Dois bacharéis petistas - o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh e o ex-ministro Tarso Genro - até pleiteiam uma vaga no Supremo Tribunal Federal. Gente assim sabida não teria dificuldade para encontrar algo roto no governo FH.

Há só um problema: o PT é o esfarrapado. Melhor guardar energias para a festa do 26º aniversário, marcada para ontem. À tarde, o Professor Luizinho confirmou que iria. A cueca dos dólares não foi convidada.