Título: Amazônia guarda santuário
Autor: Claudia Bojunga
Fonte: Jornal do Brasil, 10/02/2006, Ciência, p. A15

Floresta brasileira pode ter lugar tão isolado quanto o descoberto em Papua

É possível que no Brasil existam lugares como a região indonésia apelidada de ¿Jardim do Éden¿ onde foram encontradas novas espécies de mamíferos, aves, sapos e plantas. Quem afirma é o próprio autor da descoberta, o pesquisador britânico Bruce Beehler, em entrevista exclusiva ao JB . O cientista crê existirem recantos tão isolados como o de Papua na Amazônia, nos Andes ¿ que se estende por toda a América do Sul ¿ e na bacia do Congo, Centro-Oeste da África, devido à grande extensão dessas áreas. O ornitólogo, ligado à ONG Conservation International ¿ que montou a expedição, relembra a sensação de felicidade e surpresa.

¿ Achava que iríamos encontrar uma ou duas espécies, mas descobrimos mais de quarenta. Foi inesperado ¿ festeja Beehler.

A natureza foi mantida intocada durante tanto tempo devido à ausência completa de presença humana na floresta, onde vivem pouco mais de cem pessoas. Além disso, a caça nas proximidades é abundante e as tribos não têm por que buscar alimento no interior da mata.

A equipe, composta por 25 especialistas dos Estados Unidos, Indonésia e Austrália, precisou ir de helicóptero à área das montanhas de Foja, cujo cume pode chegar a 2.200 m de altura, a Oeste de Nova Guiné.

Beehler ressalta que a pesquisa vai ter grande influência para conservação das espécies. A partir do momento em que se identificam as áreas de biodiversidade, pode se determinar onde o trabalho de preservação é mais necessário. O santuário é protegido por leis.

¿ É importante ter lugares tão puros e primitivos, porque a partir deles pode se tentar imaginar como a terra era no começo ¿ afirma Beehler ao JB, lembrando que os animais isolados, sem contato com humanos, não reagiram com medo à presença dos pesquisadores.

O especialista pretende repetir a viagem ainda este ano.

¿ Aguardo a autorização do governo e precisamos de recursos ¿ afirma.

Os cientistas abriram duas trilhas de 4 km na mata, deixando grandes partes por serem exploradas. Dos achados que considera mais interessantes, ressaltou a ave-do-paraíso, nunca antes fotografada:

¿ O macho faz uma dança do acasalamento muito peculiar, mostrando suas bonitas penas, na cabeça. É uma espécie muito rara e especial, em que a fêmea faz o ninho sozinha.

O Parotia berlepschi, nome científico do pássaro, chegou a ser descrito no século XIX através de espécimes coletados por caçadores da Nova Guiné. Foram feitas várias expedições para descobrir sua origem, mas até agora nada havia sido descoberto. Outra ave a chamar a atenção pela aparência ¿ devido à pele laranja que cobre o olho ¿ se alimenta apenas de mel silvestre e ainda não foi batizada.

A expedição também encontrou o que pode ser a primeira flor registrada do gênero rododendro ¿ com quase 15 cm ¿ , quatro borboletas e cinco palmeiras. Dentre os 20 sapos contabilizados há uma rã anã com menos de 14 mm, além de uma coruja, a Aegotheles albertisi e o Dendrolagus pulcherrimus, ou ¿canguru-manto-dourado-das-árvores¿, considerado extinto. Beehler conta que o geógrafo americano Jared Diamond ¿ autor do best seller Colapso , que já havia estado na região ¿ indicou o local. Há 25 anos, Diamond descobriu o lar de um pássaro australiano similar à ave-do-paraíso, na mesma montanha. O americano revela que trouxe os animais para seu laboratório.

¿ Essas espécies são únicas e endêmicas da região, tendo se diferenciado ao longo dos anos nesse isolamento ¿ diz.