Título: ''Ele era um tipo de capanga''
Autor: Lígia Maria
Fonte: Jornal do Brasil, 16/02/2006, Brasília, p. D5

''É difícil ver alguém perder a vida por causa de lixo, porque foi isso que aconteceu: minha mãe morreu por causa de lixo. Eu conhecia o Marcelo, os baianos e o trabalho que eles faziam. Era um tipo de capanga, que andava por ali para vigiar os interesses deles. Eu andava por lá, trabalhava com eles e sabia que eles andavam armados. Todo mundo ali sabia e eu disse isso para os policiais. Era um sufoco trabalhar lá dentro. Além da ameaça, o risco de trabalhar no Aterro é alto. Eu já me machuquei ali, um amigo meu também. E a gente ainda passa por isso. Mas não vai ficar impune: o que eles fizeram vão pagar. Minha mãe não era vagabunda. Ela era esforçada, trabalhava dia e noite, no lixo, e não tinha tempo ruim. A deputada Érika Kokay se ofereceu para ajudar a gente e eu vou aceitar, porque Marcelo tirou a vida de três pessoas: da minha mãe e dos meus dois irmãos que estavam na barriga dela. Sem falar dos onze que estão aí. E agora? O que será dos doze filhos que minha mãe deixou? Ele pode ter certeza de que, enquanto eu tiver vida e puder correr atrás de Justiça, vou me levantar e lutar por isso. Não vou descansar enquanto não vir o Marcelo atrás das grades. Durante parte da minha vida, eu não entedia o motivo de ter crescido longe dela. Só entendi depois que cresci. E agora vou lutar para mostrar para ela o quanto eu a amava. Porque tenho certeza que ela está olhando por nós de onde está''.