Título: Morales burla a Constituição
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Fonte: Jornal do Brasil, 16/02/2006, Internacional, p. A9

LA PAZ - O presidente da Bolívia, Evo Morales, criou ontem uma polêmica ao dizer que vai continuar a dirigir o sindicato dos produtores de coca. Exercer os dois cargos simultaneamente é proibido pela Constituição.

Setores empresariais, sindicatos e a oposição parlamentar fizeram duras críticas ao mandatário por querer se manter no cargo que ocupou durante dezoito anos.

- Um presidente também pode ser dirigente sindical. Isso nos diferencia dos partidos tradicionais, essa é uma forma de não nos separarmos do povo - declarou Morales, um indígena aimara que também lidera o Movimento ao Socialismo (MAS), partido do governo.

Um artigo da Constituição define que os funcionários e empregados públicos ''são servidores exclusivos da coletividade e não de partes dela ou de um partido político'', recordou o ex-vice-ministro da Justiça, Carlos Alarcón.

Morales foi reconduzido ontem, pela sexta vez consecutiva, à liderança dos sindicatos cocaleiros do Chapare, no Centro do país. Seu mandato sindical tem duração de dois anos.

No mesmo dia, Morales se colocou em uma situação complicada em relação aos seus aliados cocaleiros, ao afirmar que as autoridades americanas anti-drogas devem continuar na Bolívia.

Os produtores do Chapare - principal alvo do programa de Washington para erradicação da coca - pediram que os americanos fossem expulsos do país.

- Todas as instituições que recebem apoio direto dos EUA devem ir para casa - afirmou Julio Salazar, dirigente cocaleiro da região.

Mas o presidente declarou que as autoridades dos EUA podem continuar por tempo indeterminado em território nacional, com a condição que respeitem a soberania da nação, terceira maior produtora de cocaína do mundo, depois de Colômbia e Peru.

- Todo mundo tem o direito de estar em nosso país, desde que não afronte a dignidade da população - afirmou, em uma cerimônia em que recebeu uma medalha de reconhecimento pelas Forças Armadas. - É importante que tenhamos relações internacionais.

O pedido de expulsão dos americanos, decidido durante um encontro de cocaleiros na cidade de Cochabamba fez com que a embaixada dos Estados Unidos adiasse um encontro com o czar da droga na Bolívia, Felipe Caceres.

O apoio dos cocaleiros é importante para Morales, que pretende atender aos interesses dos trabalhadores pobres do país e dos movimentos sociais, entre os quais os produtores de coca tem especial prestígio.