Título: ''Uma vergonha para o Brasil''
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 16/02/2006, País, p. A6
O Palácio do Planalto e o governo de São Paulo não se manifestaram, até o início da noite de ontem, sobre a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo. O ex-ministro de Direitos Humanos do governo Lula, Nilmário Miranda, considerou a absolvição ''uma vergonha''. Este também foi o tom da reação de dirigentes de entidades de direitos humanos. Para Sandra Carvalho, da ONG Justiça Global, que vem acompanhando o processo do massacre do Carandiru, a absolvição do coronel Ubiratan Guimarães afeta a imagem do Brasil, dá força a ações criminosas da polícia e põe em xeque a estrutura criada para combater a violência policial no país, como ouvidorias e corregedorias. Segundo ela, a sensação de impunidade acaba sendo um estímulo para novas ações violentas da polícia.
Sandra prevê uma reação de organismos internacionais, como a Comissão de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) e do grupo que trata de execuções sumárias na ONU.
- Foi dada chancela às execuções sumárias praticadas por policiais. Dá apoio ao conceito de que a polícia competente é aquela extremamente violenta - diz a ativista dos direitos humanos.
Sobrevivente da chacina, o músico e escritor André du Rap, 35 anos, que estava no pavilhão 9 e fazia aniversário no dia do massacre, disse que já esperava a absolvição do coronel Ubiratan.
- Desde o começo foi essa palhaçada, não fiquei surpreso. Mais uma vez, a Justiça não serviu, só serve para os pobres. É fácil condenar quem é da periferia, não aquele que tem dinheiro, diz André, autor de livro sobre o massacre.
Segundo o músico, o resultado do julgamento favorece outros casos de impunidade no país.
- Um garotão filho de juiz põe fogo no índio, e é tudo brincadeira. A população tem que mostrar que não ficou satisfeita.
Representando a Ação dos Cristãos pela Abolição da Tortura (Acat), Paulo César Sampaio disse que o resultado do julgamento ''é uma vergonha para o Brasil'', o que equivaleria a uma licença para matar. Segundo ele, a decisão do tribunal ''mostra que neste país a Justiça só pune favelado''.
Ariel Castro Alves, coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos em São Paulo, explicou que a absolvição de Ubiratan é um fato ''completamente atípico''.
- Eu nunca vi uma coisa dessas. Os desembargadores reinterpretaram a decisão do júri. Isso não existe. Se a decisão anterior tinha problemas, o correto seria anulá-la, e não corrigi-la. Para isso seria necessário um novo júri.''