Título: Carandiru: coronel é absolvido
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Fonte: Jornal do Brasil, 16/02/2006, País, p. A6

SÃO PAULO - Mais de 13 anos depois do episódio conhecido como massacre do Carandiru, que resultou na morte de 111 presos, o coronel da reserva da Polícia Militar Ubiratan Guimarães, que chefiou a invasão na Casa de Detenção, foi absolvido ontem pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. A pena de 632 anos, determinada pelo 2º Tribunal do Júri de São Paulo em 2001, foi anulada. Vinte desembargadores do Órgão Especial do TJ votaram ontem a favor da defesa do coronel Ubiratan. Apenas dois defenderam a manutenção da pena.

O Ministério Público informou que vai recorrer ao STJ (Superior Tribunal de Justiça). O pedido de anulação da sentença de 632 anos, correspondente a 102 homicídios e cinco tentativas de homicídio, foi julgado pelo Órgão Especial porque Ubiratan se elegeu deputado estadual em 2002. Ele, na época, ganhou o benefício de recorrer em liberdade. Nenhum outro policial envolvido na ação foi condenado ainda.

Em uma sessão de cinco horas, o Tribunal de Justiça aceitou a tese da nulidade apresentada pela defesa do coronel Ubiratan. Segundo o advogado Vicente Cascione -também deputado federal pelo PTB, mesmo partido do oficial, a votação dos quesitos pelos jurados em 2001 foi contraditória e, portanto, nula.

Para a maioria dos desembargadores, os jurados queriam absolver o coronel Ubiratan quando responderam as perguntas. Mas as respostas teriam sido mal interpretadas pela juíza Maria Cristina Cotrofe, que não foi localizada ontem.

De acordo com a visão dos desembargadores, os jurados aceitaram a tese de estrito cumprimento do dever e, mesmo assim, foi votado o item que questionava possível excesso por parte do coronel Ubiratan.

Segundo a avaliação dos desembargadores, a resposta do primeiro item pelos jurados tornou nulo o segundo item. Logo, o TJ afirma que apenas restabeleceu a intenção dos jurados, que seria de absolvição do oficial.

O início da votação pelos desembargadores parecia trazer um resultado desfavorável para o coronel Ubiratan. O relator do caso, o desembargador Mohamed Amaro, votou contra o pedido de anulação da sentença do júri de 2001. Amaro afirmou que não havia contradições entra a vontade dos jurados e a sentença de primeira instância.

O desembargador Vallim Bellocchi seguiu o relator. A partir daí, o quadro se inverteu. O desembargador Walter de Almeida Guilherme defendeu que havia nulidade na votação dos quesitos pelos jurados. Ele disse que o reconhecimento do estrito cumprimento do dever colocou em dúvida a validade da resposta seguinte, quando os jurados responderam sobre se houve excesso do oficial. Os 19 votos seguintes também foram favoráveis ao coronel Ubiratan. O anúncio da decisão provocou aplausos por parte de assessores do coronel Ubiratan e por oficiais da reserva que o acompanhavam e também vaias de pessoas que assistiam o julgamento no plenário do Órgão Especial.

- Sabia que a justiça seria feita. Sinto pelas mortes, mas os policiais apenas reagiram -, afirmou o coronel.

O procurador Antonio Visconti disse que o Ministério Público vai tentar anular a decisão nos tribunais superiores.

- É a praga do julgamento ideológico. Alguns consideram que os direitos humanos são para as pessoas consideradas de bem e não para os marginais - afirmou Visconti.

O massacre do Carandiru teve repercussão internacional devido à quantidade de mortos envolvidos e também pela forma como os presos foram abordados e mortos pela polícia. Muitos foram encurralados nas celas, sem chance de se defender. Alguns presos se jogaram em cima de cadáveres para fingir que estavam mortos e tentar sobreviver.