Título: Supremo proíbe nepotismo
Autor: Luis Orlando Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 17/02/2006, País, p. A3

O Supremo Tribunal Federal declarou constitucional, por nove votos a um, a resolução contra a prática do nepotismo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A decisão - ao julgar em caráter liminar ação proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros - tem efeito imediato. Os juízes e tribunais estão obrigados a suspender as medidas cautelares concedidas a servidores atingidos pela resolução e os respectivos processos, até o julgamento do mérito da ação declaratória, cujo resultado deve ser idêntico ao de ontem. A resolução proibiu a nomeação de parentes até o terceiro grau (tios e sobrinhos inclusive), cônjuges, companheiros e parentes por afinidade (cunhados, noras) de magistrados para cargos de confiança e funções comissionadas nos tribunais federais e estaduais.

Os tribunais ficam obrigados a cumprir a determinação do CNJ de demitir imediatamente os parentes que continuam a ocupar cargos de confiança, com as exceções previstas na própria resolução do Conselho, entre as quais estão os servidores concursados ou pessoas cujos cônjuges ingressaram na magistratura após o casamento.

De acordo com o presidente do STF, ministro Nelson Jobim, as pessoas até então beneficiadas pela prática de nepotismo ficam impedidas de receber seus vencimentos - também a partir da publicação da decisão - e o Ministério Público Federal será devidamente informado a fim de que promova ações de improbidade administrativa contra os magistrados que se recusarem a acolher a deliberação do Supremo.

Numa sessão que durou mais de quatro horas, a única voz divergente foi a do ministro Marco Aurélio. O voto condutor foi o do relator, ministro Ayres Britto, que acolheu os principais argumentos da AMB: o CNJ tem competência constitucional para apreciar a validade dos atos administrativos praticados no âmbito do Judicário, por ser parte integrante desse poder; a prática do nepotismo é contrária aos princípios da impessoalidade e moralidade administrativas consagrados no artigo 37 da Constituição.

Britto definiu a impessoalidade como a separação absoluta separação entre o público e o privado. E acrescentou:

- Não se pode confundir o espaço caseiro com o público, nem tomar posse 'no' cargo e não 'do' cargo.

Ao analisar o princípio constitucional da igualdade, Britto sublinhou que ''a facilitação do acesso de parentes ao serviço público faz com que critérios domésticos prevaleçam sobre parâmetros de competência''.

O ministro Cezar Peluso disse que, ao conceder a liminar, preferia limitar-se ao princípio da impessoalidade:

- A tutela da coisa pública não pode ter como base o amor ou ódio.

Para Ellen Gracie, ''o Supremo deu uma contribuição importante para a construção de um verdadeiro estado democrático de direito''. Celso de Mello definiu o nepotismo como ''um gesto de dominação patrimonial do Estado, que não pode ser tolerado pelo tribunal''.

O presidente do STF, Nelson Jobim registrou a existência de leis estaduais que estabeleceram ''o nepotismo por cotas''. E citou lei do Estado de Goiás que veda a nomeação de parentes e afins para cargos de confiança, ''mas só além de dois parentes''.

Em seu voto solitário, Marco Aurélio defendeu a tese de que ação declaratória de constitucionalidade não serve para impugnar ato tido como administrativo. Além disso, entendeu que o CNJ ''legislou'', ao baixar a resolução antinepotismo, ''atuando à margem da Constituição''.