Título: Renegociação de dívidas rurais vira arma eleitoral
Autor: Daniel Pereira
Fonte: Jornal do Brasil, 18/02/2006, País, p. A5

A oposição pretende usar o veto ao projeto que autoriza a renegociação de dívidas de produtores rurais do Nordeste contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições deste ano. O plano é difundir entre o eleitorado a versão de que o veto, já anunciado, demonstra a falta de compromisso de Lula com a região nordestina e a população mais carente do país. A estratégia, destinada a despir o presidente do figurino de ¿pai dos pobres¿ que Lula ensaia vestir para garantir a reeleição, contará com pelo menos um elemento. A oposição promete relembrar, ao longo da campanha, hábitos que teriam sido adotados por petistas com a chegada ao poder. Serão rememorados à exaustão símbolos como o vinho francês Romanée Conti, oferecido pelo publicitário Duda Mendonça a Lula depois do último debate entre candidatos em 2002, e o Land Rover doado por um empresário ao ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira.

¿ Lula é um cidadão que se diz nordestino mas que, na hora de dar tratamento ao Nordeste, anuncia raivosamente o veto a um projeto de recomposição de dívidas rurais ¿ acusa o líder do PFL no Senado, José Agripino (RN).

Aprovado pelo Senado na noite de terça-feira, o projeto prevê que dívidas oriundas de operações de crédito rural da área de atuação da Agência de Desenvolvimento do Nordeste (Adene) serão renegociadas em um prazo de 25 anos. As parcelas começarão a ser pagas apenas quatro anos depois que a lei entrar em vigor. Para os contratos com valor original de até R$ 35 mil, os juros serão de 1,5% ao ano. Para a faixa de R$ 35 mil a R$ 200 mil, não haverá juros. E no caso de contratos acima de R$ 200 mil, os juros previstos serão de 2% ao ano.

O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), anunciou que o presidente Lula vetará o projeto. O motivo principal é o impacto esperado nas contas públicas. A renegociação custaria R$ 7 bilhões ao Tesouro Nacional e R$ 4,7 bilhões ao Fundo Constitucional do Nordeste (FNE). Haveria ainda prejuízo de R$ 5 bilhões já lançado no FNE, fonte de financiamento para os próprios produtores rurais. A fatura total seria de R$ 16,7 bilhões. Mercadante frisou que só 519 contratos com data de pagamento já vencida somam R$ 6 bilhões.

O senador José Agripino disse que, durante uma reunião de líderes, propôs que os tais 519 contratos ficassem de fora da renegociação, mas que aliados do Palácio do Planalto não levaram adiante a sugestão. Foram favoráveis à aprovação do projeto, por exemplo, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o líder do governo no Congresso, senador Fernando Bezerra (PTB-RN).

¿ O Planalto não aceitou porque não tem a boa vontade que diz ter com o Nordeste ¿ alega o líder do PFL.

Mercadante rechaça a acusação. Segundo ele, o governo vai editar medida provisória para autorizar a renegociação de dívidas apenas de pequenos e médios produtores rurais. A medida, explicou, visa a fazer justiça social ¿ impede a concessão de subsídio de R$ 6 bilhões para um seleto grupo de produtores, do qual fariam parte os usineiros. O maior programa social do governo, o Bolsa Família, custou R$ 6 bilhões para atender a 8 milhões de famílias.