Título: Tortura derruba comandante
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Fonte: Jornal do Brasil, 22/02/2006, Internacional, p. A13

Denúncias de tortura de soldados na Colômbia provocaram um terremoto na cúpula militar e governamental. Ontem, o comandante do Exército, general Reinaldo Castellanos, foi destituído pelo presidente Álvaro Uribe, irritado por ter descoberto os maus-tratos praticamente pela imprensa.

Os abusos, inclusive sexuais, ocorreram em 25 de janeiro, em uma guarnição do Centro da Colômbia - onde são violentos os combates entre os militares e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Segundo expôs a revista ''Semana'', na edição de domingo, 21 recrutas foram castigados pelos superiores hierárquicos por não terem superado um teste de treinamento do qual participaram 66 homens.

Parentes denunciaram ao semanário que aqueles que falharam foram vendados, sentados em cadeiras quentes, espancados e queimados no peito e no rosto com ferro em brasa, para marcar gado. Alguns tiveram a face coberta por esterco de vaca. Em pelo menos um caso, o soldado foi agredido sexualmente com um bastão. A ''Semana'' ilustrou a reportagem com fotos dos jovens feridos. Numa delas, um homem ficou com uma marca na perna, ao lado da tatuagem ''que o oficial queria apagar a ferro quente''.

Em entrevista à rádio ''La W'', Castellano contou que o ministro da Defesa, Carlos Ospina, havia pedido que ele renunciasse e prometeu que também se afastaria do cargo. De acordo com funcionários da presidência, que preferiram não se identificar, Uribe tomou a decisão de destituir o general pelos abusos, mas ''principalmente pelo fato de ter sido informado tardiamente do caso''. Apesar de os maus-tratos terem acontecido há quase um mês, só no sábado o Ministério da Defesa comunicou o escândalo ao palácio, na véspera da publicação da reportagem.

- É deplorável que o Exército, num momento tão crucial da nossa história, esteja envolvido em um caso grave como este. Dói, é muito grave e inconcebível - censurou o presidente. - Também deploro o atraso em se informar à opinião pública. Embora o Exército tenha dito que começou a tomar providência assim que soube, há coisas que os cidadãos precisam tomar conhecimento imediatamente.

Castellano explicou que manteve o caso em reserva para não prejudicar uma investigação interna, aberta no dia 27. E provocou:

- Não tenho porque reportar tudo que acontece no Exército ao Ministério da Defesa. Sei quais são as minhas responsabilidades, o que posso ou não fazer. Mais adiante teria tempo de informar sobre a investigação interna.

Em apoio ao general, comandante da ofensiva ao bastião das Farc no Sudeste da Colômbia, Luis Antonio Coronado, também apresentou renúncia.

- Não estou de acordo com a decisão do governo. Devo lealdade ao comandante do Exército - explicou o chefe militar da IV Divisão, a ponta-de-lança da ofensiva contra o que considera-se a retaguarda histórica das Farc.

O caso provocou ainda a destituição, na segunda-feira, do coronel Rubén Hernández, comandante do batalhão Patriotas da cidade de Honda (200 km ao Sul de Bogotá). O oficial era o responsável pelo Centro de Instrução e Treinamento do Exército, onde ocorreram os abusos, no município de Piedras.

- É uma vergonha - reagiu o ministro Ospina, por enquanto longe de ser ministro demissionário.

No entanto, a autoridade confia que o escândalo não terá ''conseqüências internacionais''. A referência é a uma eventual reação dos Estados Unidos, financiador em US$ 726 milhões do Plano Colômbia, de combate ao narcotráfico e à guerrilha. Para aprovar o repasse, os americanos colocaram como condição um certificado de respeito aos Direitos Humanos por parte de Bogotá.