Título: Remessa indica piso do dólar
Autor: Fernando Nakagawa
Fonte: Jornal do Brasil, 22/02/2006, Economia & Negócios, p. A18

O aumento das remessas ao exterior gerou em janeiro o primeiro déficit em conta corrente do setor externo desde novembro de 2004. Desde aquela data, o Brasil apresentava apenas resultados positivos. Para analistas, o aumento das remessas de multinacionais às matrizes e o déficit nas contas externas podem indicar que o ciclo de queda do dólar está chegando ao fim.

Em janeiro, o Brasil teve déficit em conta corrente de US$ 452 milhões contra resultado positivo de US$ 802 milhões no primeiro mês do ano passado. O cálculo leva em conta o resultado da balança comercial, a conta de serviços e as transferências de dinheiro entre países. Essa reversão foi diretamente influenciada pelo forte aumento do volume de remessas ao exterior.

Em janeiro, o envio de remessas líquidas de renda somou US$ 3,2 bilhões, valor 133% maior que o registrado em igual período do ano anterior. Apenas a remessa de lucros e dividendos atingiu US$ 1,540 bilhão frente aos US$ 372 milhões registrados em janeiro de 2005. A variação representa um salto de 314%.

- A apreciação cambial contribuiu para que o estoque em dólar crescesse - disse o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, ao comentar o efeito da valorização cambial sobre o caixa das empresas que passam a ter mais dólares pela mesma quantidade de reais.

Além disso, ele lembrou que a rentabilidade das empresas cresceu nos últimos meses, o que eleva o volume de recursos disponíveis para o envio ao exterior.

Na avaliação do professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, Antônio Carlos Manfredini, o resultado das contas externas indica o fim dos dias de valorização do real.

- Esse resultado pode mostrar que estamos muito próximos ao limite inferior do câmbio - disse.

Segundo o professor da FGV-EAESP, as empresas que aceleraram o envio de recursos ''mostram que acreditam que o dólar não deve ficar muito mais barato do que já está''.

- Para essas multinacionais, é boa hora de fazer a troca de moedas e remeter. Com isso, parece que estamos no piso do dólar - completou.

Para o economista da GRC Visão, Thiago Davino, ''o resultado das contas externas reforça a tendência de valorização do dólar''. A consultoria estima que o dólar termine o ano a R$ 2,50. A redução do saldo comercial e a queda do juro real no Brasil devem favorecer esse cenário. Mas o economista observa que a alta do dólar não será instantânea.

- Esse movimento é gradual. Podemos ter altas e baixas no curto prazo, mas a tendência de médio e longo prazo é de desvalorização.

Mas ontem o avanço do dólar foi grande. A moeda americana subiu 1,79%, para R$ 2,156. Na Bolsa de Valores de São Paulo, o Ibovespa caiu 0,97%, para 38.165 pontos.

Mas não são apenas empresas que estão aproveitando o dólar baixo. Números do BC confirmam fenômeno que é visto há alguns meses nos aeroportos, casas de câmbio e vôos internacionais. Com a queda do dólar, está mais barato viajar para o exterior. Em janeiro, brasileiros gastaram US$ 397 milhões lá fora. O valor é 34% maior que o registrado em janeiro de 2005, quando os nossos turistas deixaram US$ 296 milhões no exterior. Em fevereiro, até ontem, as despesas somavam US$ 297 milhões.

O BC revelou que, em janeiro, a dívida externa estava em US$ 168,613 bi, menor nível desde dezembro de 1995.