Título: A economia no alvo dos movimentos sociais
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 23/11/2004, O país, p. A2

Conferência Terra e Água recebe Lula e cobra demissão de Palocci

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai encontrar movimentos sociais em clima de revolta na Conferência Nacional Terra e Água, que reúne 5 mil participantes em Brasília. Lula tem discurso marcado para hoje no evento, que aprofunda o ataque à política econômica do governo e pede a demissão do ministro da Fazenda, Antônio Palocci.

Em meio a cartazes de Lênin, Engels, Mao-Tsé Tung e Che Guevara, um dos coordenadores nacionais do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), João Paulo Rodrigues, anunciou ontem que vai intensificar a luta urbana de 44 movimentos sociais contra a condução da macroeconomia.

Os primeiros alvos dos manifestantes serão os prédios do Banco Central, na quinta-feira, onde vão protestar contra a política conduzida por Palocci.

- Queremos dizer para o presidente que nós, do campo, estamos muito insatisfeitos com esta política econômica do Palocci e queremos a demissão dele, sim. Caso contrário, não vai haver reforma agrária nesse país - cobrou João Paulo, sob aplausos.

A conferência tem patrocínio dos ministérios do Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente, do Banco Popular do Brasil e da Caixa Econômica Federal - instituições oficiais subordinadas ao Ministério da Fazenda - além de várias empresas estatais, entre elas Petrobras. O ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, foi à abertura da conferência para anunciar o apoio do governo à luta dos movimentos sociais.

- O país que estamos construindo não enxerga nos movimentos sociais, nos lutadores e nas lutadoras da Justiça, adversários de um processo de mudança. Vocês são aliados fundamentais numa agenda de mudanças que queremos para um Brasil novo - anunciou Rossetto.

Após ser recebido ao som de ''Para não dizer que não falei das flores'', Rossetto inicialmente recebeu vaias de uma parcela de trabalhadores rurais, que depois o aplaudiu. Era um protesto pelas cinco mortes de sem-terra em Felisburgo (MG), no sábado, e pela falta de cumprimento da meta da reforma agrária.

João Paulo não sabe se os manifestantes da conferência vão à sede do Banco Central em Brasília, mas anunciou que os protestos de quinta-feira devem ser realizados em todas as capitais onde o BC tem prédios, exemplo de Rio e São Paulo. A luta unificada dos movimentos sociais, diz o líder do MST, é contra o modelo econômico. João Paulo prevê mais conflitos no campo se não sair a reforma agrária.

- O não cumprimento da meta terá consequência: o conflito da terra - ameaçou o líder do MST.

Lula vai encontrar hoje na conferência faixas de protesto contra a política econômica, com dizeres como ''Queremos comer o superávit primário'', ou ''Fora superávit primário''. Há também faixa de protesto contra o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Uma diz: ''Meirelles, volte para Boston''.

João Paulo afirmou que o MST vai continuar com as invasões de terra enquanto não for feita uma reforma agrária em larga escala. O líder do MST anunciou que os manifestantes do movimento em Felisburgo vão invadir por tempo indeterminado a fazenda onde cinco trabalhadores sem-terra foram assassinados no sábado:

- Nosso povo não tem medo de jagunços armados, de gigolôs de vacas.

Rosseto não foi a única autoridade do governo a prestar apoio aos sem-terra. O secretário de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, foi ao evento representando a ministra Marina Silva. Capobianco criticou a decisão da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) de liberar algodão transgênico.