Título: ''Não existe um governo honesto por completo''
Autor: Daniel Pereira e Tina Vieira
Fonte: Jornal do Brasil, 27/02/2006, País, p. A2

A oposição perdeu o tom diante da recuperação de popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pelo menos o tom polido no debate político. Secretário-geral do PSDB, o deputado Eduardo Paes (RJ) diz que o petista voltou à liderança nas pesquisas devido a uma combinação de ¿desfaçatez e cara-de-pau¿. Para impedir que Lula continue no Palácio do Planalto em 2007, Paes promete desmascarar o adversário durante a campanha. Hoje, a principal preocupação do deputado, no entanto, não é com as sondagens eleitorais, mas com a indefinição do candidato tucano à Presidência da República. Paes defende a escolha até 6 de março. Até porque, a disputa entre o governador Geraldo Alckmin e o prefeito José Serra já renderia desgastes e ameaçaria, inclusive, a unidade do partido.

¿ Talvez seja otimista demais, mas quero ser sincero. Não é desconforto ter que escolher entre o Ronaldinho e o Ronaldinho Gaúcho e, eventualmente, ainda contar com o Robinho ¿ afirma Paes.

Faz referência ao trio Alckmin, Serra e Aécio Neves, mas sem esclarecer quem veste cada camisa no ataque tucano. Eduardo Paes também aponta as armas do PSDB para conquistar o eleitorado: Entre elas, o ex- presidente Fernando Henrique, que ¿sabe como ganhar da demagogia e da farsa que é o PT¿.

- O PSDB errou ao deixar para março a definição do candidato do partido à Presidência da República?

- Desde a posse do Lula, o PSDB vem sendo cobrado para apresentar um nome. Nos últimos seis meses, então, quase batem na gente para indicarmos o candidato. Numa lista de cinco nomes do PSDB, os três primeiros ocupam funções executivas: Geraldo Alckmin, José Serra e Aécio Neves. Não tem como antecipar o processo. O que conseguimos adiar por um bom tempo acabou gerando um certo desgaste na disputa interna.

- Um pouco de salto alto com a queda de popularidade do presidente no ano passado contribuiu para a demora na definição?

-Algumas pessoas podem ter se iludido com as pesquisas, achando que a fatura estava liquidada a favor do PSDB. O comando do partido não está assustado com a recuperação do Lula. Sempre achamos que ele era um candidato forte. É um sujeito que passa, como ele mesmo declarou, 365 dias do ano fazendo campanha. Muita demagogia, muito populismo, gera, sem dúvida, base social. Essa recuperação é sazonal. Em geral, no primeiro trimestre os presidentes estão sempre em situação melhor, sobretudo pela questão do emprego no fim e no início do ano. Não acho que ele esteja numa situação confortável.

- O PSDB sairá rachado do processo de escolha do candidato?

- Prefiro acreditar que não, apesar de algumas manifestações um pouco mais duras de ambos os lados.

- Por que os caciques do PSDB preferem Serra?

- Não sei se essa é uma decisão já tomada. Esse processo de discussão é fruto da falta de uma leitura clara de quem é o melhor quadro para disputar a eleição. Se temos candidatos competitivos, isso se dá pelo trabalho deles, mas também pela ação do partido, que colocou o Lula no seu devido lugar. Mostrou quem era o presidente e como é o governo do PT. Portanto, nenhum candidato pode se proclamar o rei da cocada preta, porque essa possibilidade de vitória tem muito a ver com a ação do partido, dos parlamentares e dos governadores.

- Alckmin e Serra têm estilos diferentes. Qual dos dois se encaixa no modelo que o PSDB pretende apresentar ao eleitorado?

- Será que são diferentes mesmo? Quem é o mais agressivo? No momento, o Geraldo está muito mais firme. E o Serra, supostamente mais agressivo, está mais light.

- Os ditos mercados emitem sinais de certa apreensão em relação a Serra. Teriam preferência por Alckmin...

- Estabeleceu-se o consenso de que o Geraldo tem apoio do empresariado e do setor financeiro. Quando o Serra apregoou uma lei de responsabilidade cambial, tentou mostrar a necessidade de aumentar o câmbio, desvalorizar o real. Isso agrada muito mais ao setor empresarial do que ao setor financeiro.

- O senhor defenderá o nome de quem?

- Tenho ligação muito forte com Serra, mas sou favorável à candidatura que nos dê maiores possibilidades de vitória. Para sair, o Serra precisa da unidade do partido. No caso do Geraldo, temos hoje uma situação de partida mais difícil, mas ele tem um potencial de crescimento enorme.

- Não é anti-democrático deixar na mão de poucos líderes a definição do candidato?

- Não está nas mãos de poucos. Você tem três líderes absolutamente representativas. Aécio é governador de Minas, Tasso é o presidente do partido. Fernando Henrique está acima de todos nós pelo fato de ter sido presidente da República e já ter ganho duas eleições do presidente Lula.

- Parlamentares do PSDB dizem que as críticas de FH ao PT contribuíram para a recuperação de popularidade de Lula...

- Estou falando do processo decisório. A participação do presidente Fernando Henrique, com sua experiência e seu histórico de vitórias sobre o Lula, é fundamental. Outra coisa é o processo político. Neste momento, ele colabora com o partido na construção política. Isso demonstra coragem e ousadia, porque ele não precisava, podia estar navegando com tranqüilidade e vendo a tragédia que é o governo Lula.

- As pesquisas não têm sido justas com o ex-presidente?

- Fernando Henrique não é candidato e nunca pretendeu ser.

- O prefeito José Serra, pelo menos oficialmente, também não é candidato...

- Mas é um nome à disposição do partido. Não podemos dizer que o Fernando Henrique é um político aposentado, mas ele já cumpriu dois mandatos de presidente da República. O Serra é um político na ativa, está tapando buraco em São Paulo, podando árvore, participando do debate. Não é um candidato lançado, mas é um nome com o qual o partido conta.

- A saída de Serra da prefeitura de São Paulo não pode resultar em prejuízo político para o PSDB caso ele perca a eleição?

- Não tenho dúvida. E o Serra não esconde isso. São Paulo é muito importante para qualquer partido. Mas, se ficar muito claro que o Brasil deseja o prefeito Serra, que o partido precisa do passe dele, a população de São Paulo saberá compreender.

- O PSDB vive momento de desconforto?

- Talvez seja otimismo demais dizer que não é desconforto ter que escolher entre o Ronaldinho e o Ronaldinho Gaúcho e, eventualmente, contar com o Robinho. Desconforto é ter candidato ruim disputando prévia e um presidente envolvido numa rede de corrupção montada com seus amigos. Não há hipótese de a incompetência, os números pífios do governo, a rede de corrupção, passarem incólume na campanha. Isso é que dá desconforto.

- Cientistas políticos e parlamentares afirmam que o PSDB também tem telhado de vidro...

- Não existe na história do Brasil um governo honesto por completo. O governo FH teve problemas de corrupção. Imagina o que Delúbio Soares não teria aprontado com todas as teles na mão.

- Apesar de o senhor considerar pífios os números do governo, o PT aposta na comparação com a gestão anterior...

- Temos de mostrar como o presidente Fernando Henrique pegou e como deixou o Brasil. Depois, é importante dizer que os números de 2002 dizem respeito à tragédia pela perspectiva de um grupo de demagogos que assumiu o poder. Mostraremos também que parte das promessas não foi cumprida.

- Como o presidente Lula conseguiu reassumir a ponta nas pesquisas?

- Desfaçatez, cara-de-pau e falta de vergonha na cara. A CPI dos Correios já provou que os recursos do mensalão vieram do Banco do Brasil-Visanet e eles continuam negando. É óbvio que você tem uma parcela da população que está menos atenta e jogou muita esperança no presidente. Por isso, ainda cai nessa conversinha do PT. Os números da pesquisa são muito ruins para o presidente da República. O nível de rejeição é altíssimo. As pessoas mais informadas estão majoritariamente com o PSDB.

- O presidente também cresceu nos segmentos mais escolarizados...

- Estamos num processo interno de discussão que de fato não é bom. Mas não tenho dúvida de que na campanha eleitoral esclareceremos bem a população e o PSDB fará o próximo presidente.