Título: Intolerância mata brasileiro
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 27/02/2006, Internacional, p. A4
O assassinato de um travesti brasileiro na cidade do Porto, em Portugal, expôs a pior face de um grupo de delinqüentes juvenis assistidos por uma instituição social. O paulista Gisberto Sauce Neto, de 45 anos, foi morto por 12 menores com idades entre 13 e 16 anos, todos internos da Oficina de São José, ligada à Igreja, que abriga e educa filhos de famílias com problemas. O mais velho já foi preso.
Gisberto vivia em Portugal desde 1990, usando o nome de Gisberta ou, simplesmente, Gis. Quando chegou ao país, seu objetivo era juntar dinheiro para fazer uma operação de mudança de sexo, nunca realizada. No entanto, se prostituiu e se viciou em cocaína. Na década de 90, fez shows em casas noturnas portuguesas, e seu principal número era a imitação da cantora baiana Daniela Mercury.
Há três semanas, os menores espancaram e atiraram pedras contra Gisberto no prédio abandonado onde vivia antes de atirar seu corpo num poço. A polícia acredita que o preconceito contra homossexuais é a causa do crime, já que a vítima foi sodomizada.
Na segunda-feira, um dos 12 jovens criminosos contou o que aconteceu a uma professora. Dois dias depois, todos foram ouvidos em um tribunal da região.
O caso iniciou uma discussão sobre o enquadramento penal de menores em Portugal. Segundo a lei atual, o juiz poderá enviar os que cometeram o crime para a própria Oficina de São José, que não tem regime fechado. Onze dos jovens vão passar três meses em centros educativos, dos quais 10 em regime semi-aberto e um em regime fechado. O único dos 12 que tem mais de 16 anos ficará em prisão preventiva até a realização do julgamento.
O presidente do Instituto da Segurança Social, Edmundo Martinho, deu ordem para a que fosse realizada uma inspeção na Oficina de São José, depois de denúncias de que vários dos alunos da instituição fazem parte de grupos de delinqüência juvenil da cidade.
Segundo a responsável pelo consulado do Brasil no Porto, Marília Sardemberg, o escritório não pode fazer nada em relação ao caso por enquanto:
- Na sexta-feira, quando começaram a falar que a vítima poderia ser brasileira, nós pedimos a confirmação da identidade e da nacionalidade à Polícia Judiciária, mas ainda não recebemos nenhuma informação. Achamos muito estranho que ainda não temos resposta mesmo a imprensa tendo publicado todos os dados.
Após a confirmação oficial da identidade, o consulado entrará em contato com o Itamaraty, que vai comunicar à família. Segundo Marília, o passo seguinte deverá ser encontrar a solução para o traslado do corpo para o Brasil, provavelmente às custas do governo brasileiro.
- Pode levar um tempo, porque há necessidade de autópsia e outros procedimentos - emendou.
Nos últimos anos, Gisberto havia se tornado sem-teto e freqüentava duas instituições de apoio social: a Abraço, que se dedica a pessoas infectadas pelo vírus da aids, e a Espaço Pessoa, de apoio a prostitutas.