Título: Previdência paga benefício de até R$ 71,5 mil a aposentados
Autor: Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 01/03/2006, País, p. A2
O governo Lula sustentou na folha de pagamento da Previdência Social, ao longo de todo o ano passado, pelo menos uma centena de marajás. Foi o que revelou uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) a qual o Jornal do Brasil teve acesso. Segundo o TCU, até dezembro de 2005 cem pessoas recebiam acima do teto salarial do serviço público fixado por lei em R$ 21,5 mil. Dois deles embolsavam mais de R$ 71,5 mil mensais, uma bolada de fazer inveja às raposas mais felpudas da política, em tempos de mensalão.
Para uma população que mal sobrevive com pouco mais de um salário mínimo - hoje em R$ 300 - a descoberta do tribunal soa como provocação. Dois dos maiores benefícios ainda são pagos em uma mesma agência bancária, a Nossa Caixa, localizada no bairro de Embaré em Santos (SP), com população próxima de 36 mil habitantes.
Até o fim do ano passado, 67 pessoas recebiam da Previdência religiosamente até o quinto dia útil de cada mês entre R$ 21,5 mil e R$ 31,4 mil. Onze pessoas entre R$ 31,5 mil e R$ 41,4 mil, quinze entre R$ 41,5 mil e R$ 51,4 mil, cinco entre R$ 51,5 mil e R$ 61,4 mil e duas pessoas mais do que R$ 71,5 mil. Os dados foram repassados a pedido do JB pelo site Contas Abertas.
De acordo com o INSS, a maioria dos beneficiários são ex-portuários. Além da aposentadoria, acumulam benefícios pelo fato de terem sido equiparados aos ex-combatentes da II Guerra Mundial e recebem reajustes como se permanecessem na ativa.
Em janeiro, depois da determinação do TCU para que a mordomia fosse cortada, o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) cancelou os repasses a 77 contribuintes. Outros 23, no entanto, continuam recebendo os benefícios milionários. Os nomes dos felizardos são mantidos em sigilo pelo órgão. Por intermédio de sua assessoria, o INSS informou que a maioria desses proventos está amparada por liminares concedidas pela Justiça.
Pela Constituição, o valor máximo de benefícios previdenciários não pode ultrapassar a quantia de R$ 21,5 mil mensais, correspondente ao subsídio mensal de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), fixado como o teto do serviço público.
A auditoria foi aberta no ano passado pelo TCU para investigar a existência de eventuais irregularidades nas contas da Previdência Social. A pesquisa foi feita na base de dados de benefícios ativos da Previdência que contém cerca de 23 milhões de registros. O pagamento foi comprovado em consultas ao sistema Sisbem.
Em dezembro, o TCU enviou um ofício ao diretor de benefícios do Ministério da Previdência Social, Benedito Bruca, solicitando a abertura de investigação para descobrir possíveis irregularidades no pagamento desses benefícios, a imediata suspensão daqueles que não estivessem regularizados e a restituição dos valores irregularmente pagos desde primeiro de janeiro de 2005.
''O analista não vislumbra razões para que o INSS continue, mesmo após a edição da Lei 11.143 de 26/07/2005, a não aplicar o abate-teto nesses benefícios para adequá-los ao valor máximo de R$ 21,5 mil. Por essa razão propõe adoção de medida cautelar obrigando a autarquia a instituir o desconto dos valores além do teto nos referidos benefícios e a promover a restituição dos valores irregularmente pagos a partir de 1/01/2005'', diz o trecho da representação do corpo técnico do tribunal.
Para promover a auditoria nas contas da Previdência, o TCU mobilizou 30 equipes de trabalho que se encarregaram de cruzar dados da Previdência, do Tribunal Superior Eleitoral e da Receita Federal. Foi a primeira vez que o tribunal teve acesso ao sistema de dados de benefícios ativos do órgão, com 23 milhões de registros.