Título: Sinal verde para as malas
Autor: Daniel Pereira e Luiz Orlando Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 02/03/2006, País, p. A3

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai fixar hoje as regras das eleições gerais deste ano, que serão consolidadas em uma única instrução normativa. Se depender do relator, ministro Carlos Eduardo Caputo Bastos, propostas anunciadas no início do ano pelo ex-presidente do TSE Carlos Velloso - e mencionadas, na ocasião, como fundamentais para coibir o crime de caixa dois - ficarão de fora do texto. Caputo Bastos defenderá, por exemplo, a derrubada da proibição do uso de dinheiro vivo em campanhas eleitorais. De acordo com a proposta apresentada por Velloso, seria obrigatória a abertura de conta bancária específica em nome do candidato para a movimentação de recursos de campanha. Os saques só poderiam ser feitos mediante cheque nominal ou transferência bancária para o beneficiário da despesa. Caputo Bastos alega que dinheiro em espécie é necessário para a realização de pequenos gastos. A tese conta com o apoio do líder da minoria no Senado, José Jorge (PFL-PE).

- Estão querendo ser mais realistas do que o rei - alerta o relator da instrução.

O ministro concorda com a proposta de obrigar os candidatos e comitês financeiros a divulgarem a cada 15 dias, no site do TSE, os valores das doações e das despesas da campanha eleitoral. Mas votará contra sugestão para que os financiadores sejam identificados durante a campanha. Ecoando cantilena já entoada, entre outros, pelo líder do PFL na Câmara, deputado Rodrigo Maia (RJ), o relator acha que a obrigatoriedade de identificação do doador antes da votação inibirá o financiamento privado.

- Não podemos matar a galinha dos ovos de ouro. Defendo a transparência, mas depois de concluída a campanha - esclarece Caputo Bastos.

Em janeiro, Velloso e o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, assinaram uma instrução normativa e uma portaria, que já estão em vigor, estabelecendo parceria entre os dois órgãos para fiscalizar as contas dos candidatos. A portaria diz, por exemplo, que serão estabelecidos nas declarações de Imposto de Renda de pessoas físicas e de empresas campos específicos para identificar doações a candidatos e partidos políticos. A idéia é cruzar tais informações com os dados de arrecadação e gasto de campanha que serão apresentados à Justiça Eleitoral.

Caputo Bastos afirma que essa questão não diz respeito ao TSE. Seria de competência apenas do Fisco.

- Eu não posso fazer isso - responde o relator da instrução.

Se depender dele, a Receita Federal não terá acesso irrestrito ao banco de dados do TSE, que seria o mais completo do país. Motivo: temor de que o Fisco use as informações para outros fins. Para justificar tal posição, o ministro suscita a inviolabilidade do sigilo de dados, que, conforme a Constituição, pode ser flexibilizada apenas para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

- Vamos usar o banco de dados da Receita. A recíproca, no entanto, não é verdadeira - adverte o relator.

Outro ponto que será votado teve inspiração direta na crise política atual. Estabelece que o candidato é sempre responsável pela arrecadação e aplicação dos recursos relacionados à sua campanha, além da veracidade da prestação de contas. Flagrados como receptores de recursos de caixa 2 providenciados por Marcos Valério, parlamentares de diferentes partidos alegam que desconheciam as irregularidades, a fim de não sofrerem punições. Entre elas, a perda de mandato.

Relator da instrução, o ministro Caputo Bastos é da cota de dois advogados dos sete integrantes do TSE. O tribunal conta ainda com três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e dois ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Todos têm direito a voto. Caso o TSE não chegue hoje a uma decisão sobre a instrução relativa às próximas eleições, haverá sessão extraordinária amanhã ou no sábado, já que termina no domingo o prazo para expedição da correspondente instrução.