Título: Como no Haiti, favelas cheias de perigos
Autor: Marcello Gazzaneo e Marco Antonio Barbosa
Fonte: Jornal do Brasil, 06/03/2006, Rio, p. A5

A ação dos militares nas favelas pode ser comparada à Missão de Paz no Haiti, local onde as gangues independentes disputam espaço com partidários armados do ex-ditador Jean-Bertrand Aristide. Há 20 meses, a ONU mantém tropas de várias nacionalidades naquele país para garantir a transição democrática. Duas condições são necessárias para que um militar do Exército Brasileiro integre as Forças de Paz da Organização das Nações Unidas no Haiti: a primeira é que deve pertencer ao efetivo profissional da Força Armada, ou seja, é vedada a presença de recrutas do de Serviço Militar Obrigatório. A outra condição é o voluntariado - todos os soldados que embarcam para o Haiti assinam um termo de compromisso antes da partida declarando ciência dos riscos.

As condições de combate, no entanto, fazem com que o nome ''Missão de Paz'' no Haiti seja apenas um eufemismo.

- Praticamente todas as semanas há algum confronto em que tropas brasileiras acabam matando um haitiano. É uma missão difícil - explica um oficial da reserva ainda ligado à inteligência militar.

O deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), formado pela Academia Militar das Agulhas Negras e ex-integrante da Brigada Pára-Quedista, diz que a grande diferença entre a ação no Rio e a do Haiti é a forma como se dá o certo às favelas.

- No Haiti há confronto direto dentro das favelas e com as gangues armadas. No Rio o que acontece é um cerco. Não há a orientação de confronto. Mas não se pode criticar o Exército, pois as Forças Armadas só podem agir nestes casos se o governador do Estado pedir ao presidente da República e este autorizar. O problema é que no Rio, por motivos eleitorais, a Polícia Militar fica de mãos atadas e não pode subir o morro de forma efetiva, diária - critica Bolsonaro.

O deputado, que ainda como militar foi preso disciplinarmente em 1986 por ter denunciado publicamente os baixos salários da tropa, suspeita que a relação dos recrutas com as comunidades carentes e com o Exército acaba levando à transgressão.

- Muitas vezes os recrutas que moram em favelas são simplesmente obrigados por traficantes a ajudar - diz.

Quanto à estratégia utilizada pelo Exército, o mesmo oficial da reserva que ressalta os confrontos no Haiti alerta para o fato de que as Forças Armadas estão cientes das estratégias dos traficantes:

- Eles dificilmente cometem roubos ousados desta forma em locais próximos de suas áreas de atuação, pois a venda de drogas diminui e eles perdem dinheiro. Portanto, não está descartada a possibilidade de ação também nas favelas da Zona Sul.

O Morro do Pavão-Pavãozinho, em Ipanema, e mais o Dona Marta e a Ladeira dos Tabajaras, em Botafogo, servem como postos intermediários da facção conhecida como Comando Vermelho para organizar invasões à Favela da Rocinha, ainda alvo de cobiça daquele grupo.