Título: Morales e Bush se enfrentam
Autor: Clara Cavour
Fonte: Jornal do Brasil, 07/03/2006, Internacional, p. A13

A primeira crise do novo governo boliviano com os Estados Unidos foi deflagrada ontem, quando o presidente, Evo Morales, acusou o governo de George Bush de fazer ''chantagens, ameaças e intimidações'' ao seu país. O comando militar americano suspendeu o financiamento ao programa de antiterrorismo de La Paz e pediu ainda a troca do comandante das Forças Armadas bolivianas.

Para Morales, trata-se de uma intromissão nos assuntos militares da Bolívia:

- Vamos dignificar e defender as Forças Armadas e nenhum comandante vai ser mudado a pedido do Exército americano - afirmou, em um discurso em comemoração do 21° aniversário da cidade de El Alto.

O JB teve acesso a uma carta em que o comandante do Grupo Militar dos EUA na Bolívia, Daniel Barreto, solicita ao comandante em chefe das Forças Armadas bolivianas, general Wilfredo Vargas Valdés, ''uma visita (à Força Contra Terrorismo Conjunta) no dia 10 do presente mês para recolher todo armamento que se entregou à unidade''. Além disso, o texto, com data de 3 de março, pede a mudança do comandante das Forças Armadas e anuncia o fim de parte da ajuda financeira para o Exército boliviano e do treinamento de militares nos EUA.

- Evo estava tentando mudar as relações com os EUA, estava buscando se aproximar. Mas esse foi um golpe do governo Bush - afirmou ao JB Baldwin Montero, editor de Política do jornal La Razón.

Segundo Morales, o comando americano comunicou os poder militar boliviano, na semana passada, de que o país não era mais visto como um parceiro adequado na guerra contra o terror. A quantia suspensa está estimada em US$ 70 mil.

- Como não aceitamos vetos ou mudanças de comando, eles nos fazem chantagens - disse o presidente, para quem o valor da ajuda ''é só troco''. - Esses recursos só estão lá para controlar a Bolívia, para manter agentes de inteligência. Somos um país pobre, mas não aceitaremos ameaças.

O governo Bush havia anunciado semanas antes o corte de 96% da ajuda militar ao país latino, devido à recusa boliviana em assinar um acordo que garantiria imunidade às tropas americanas no Tribunal Penal Internacional.

A embaixada americana em La Paz ainda não se manifestou sobre o embate diplomático. Washington vê com desconfiança a eleição de um líder cocaleiro e teme que Morales cumpra as promessas de descriminalização da coca e de ampliação das áreas de cultivo.

Apesar de freqüentes críticas aos EUA, em pouco mais de um mês no cargo, Morales vem tentando manter relações amistosas com o governo Bush, garantindo o combate ao narcotráfico. Diplomatas americanos, inclusive, disseram-se satisfeitos com os primeiros contatos com a administração do Movimento ao Socialismo (MAS). No entanto, em fevereiro, o presidente boliviano subiu o tom e condenou a decisão dos EUA de suspender o visto de entrada de uma representante do governo de La Paz que também é ex-plantadora de coca.