Título: Sindicatos vencem inflação
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Fonte: Jornal do Brasil, 10/03/2006, Economia & Negócios, p. A17

Os trabalhadores tiveram no ano passado as melhores negociações salariais dos últimos dez anos, ao conquistarem aumento real - acima da inflação - em 72% dos acordos realizados. Dos 640 casos analisados, 88% garantiram, pelo menos, a reposição do poder de compra. No setor industrial, o desempenho foi ainda melhor - oito em cada dez negociações concederam ganhos reais ao trabalhador.

A menor pressão da inflação nos salários, o crescimento da economia pelo segundo ano consecutivo e a criação de postos de trabalho contribuíram para os resultados, apontam especialistas em mercado de trabalho.

As informações constam de levantamento realizado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estaduais Sócio-Econômicos (Dieese), divulgado ontem em 18 estados do país.

O melhor resultado, até então, havia sido o de 2004, quando 81% das negociações superaram ou zeraram as perdas acumuladas pela inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) nos 12 meses anteriores a cada data-base. O índice, o mais usado nas negociações e serve para corrigir o salário mínimo e benefícios previdenciários, fechou 2005 em 5,53%.

- A inflação em baixa e a redução dos juros, aliados ao crescimento do PIB, quase que de forma contínua durante nove trimestres, o que não ocorria no país havia 15 anos, tiveram impacto significativo nas negociações - diz Clemente Ganz Lucio, diretor técnico do Dieese.

A maior parte dos ganhos superou a inflação em dois pontos percentuais - caso dos metalúrgicos, químicos e operários da construção civil paulista.

- O aumento do nível de ocupação, que cresceu 3,3% no ano passado, boa parte com carteira assinada, elevou o poder de negociação dos sindicatos - diz o economista Fábio Silveira, da RC Consultores.

- A manutenção do emprego saiu da pauta dos sindicatos e deu lugar à busca por aumento real - concorda Eleno José Bezerra, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo (Força Sindical). Os metalúrgicos conseguiram 8,3% de reposição salarial no ano passado.

O recuo do desemprego estimulou o trabalhador a participar das campanhas salariais com mais intensidade, avaliou Sérgio Luiz Leite, secretário-geral da Federação dos Químicos Paulistas.

O desempenho favorável das exportações também contribuiu para os resultados, além do aumento de 8,3% no salário mínimo, dizem especialistas.

Por atividade econômica, os aumentos reais foram mais freqüentes na indústria, onde 83,5% dos acordos resultaram em aumento salarial acima do INPC. No comércio, esse percentual atingiu 70,3% e nos serviços, 57,8%.

- É mais fácil negociar reposição com a inflação em torno de 5% - diz Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo.

Diferentemente dos anos anteriores, quando a tendência era parcelar o dissídio em até três vezes, os reajustes foram pagos em uma única vez em 95,5% dos acordos.

A incidência de abonos negociados para compensar as perdas salariais recuou. No ano passado, 11% dos acordos previam pagamento de abonos, contra 16% em 2004.

O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), João Felício, vê o resultado com cautela, porém.

- O desafio é realizar uma campanha unificada que defenda acordos salariais de maior duração.