Título: O chamado de Pedro
Autor: Mauro Santayana
Fonte: Jornal do Brasil, 13/03/2006, País, p. A2

O senador Pedro Simon chamou alguns de seus companheiros de partido ao dever: o PMDB necessita disputar a Presidência da República. Fundador do MDB, Simon sempre foi democrata, exerceu altos cargos no Executivo - entre eles o de governador do Rio Grande do Sul - e é de honradez nunca contestada. Na advertência, o parlamentar usa fortes argumentos doutrinários e pragmáticos. Um partido é mais do que seus eventuais dirigentes formais, ou líderes que sobre eles exerçam influência: é o conjunto de militantes, filiados e eleitores, enfim, daqueles cidadãos que o preferem, por esse ou aquele motivo. Pesquisas demonstram que a imensa maioria do PMDB quer candidatura própria à Presidência - e não é de hoje. Os que acompanham a vida política nacional sabem como essa vontade do PMDB foi defraudada pelas manobras da maioria de sua comissão executiva, ao longo de 1997 (com a aprovação da emenda da reeleição), e de 1998, até mesmo com a truculência de capangas, a fim de impedir, em convenção nacional, a candidatura de Itamar Franco e, assim, assegurar apoio a Fernando Henrique. O dever do PMDB, e, enfim, de qualquer partido, é o de buscar o poder.

A eleição de dois turnos facilita a mobilidade partidária entre um e outro escrutínio. Essa circunstância deu ao senador Simon o argumento pragmático. Em primeiro lugar, porque a cidadania está cansada do predomínio paulista e do tedioso confronto entre petistas de um lado e o PSDB-PFL, do outro, debate que tem sido tanto mais jejuno de idéias, quanto mais abastecido de vazio, e isso dá ao PMDB oportunidade não desprezível. Em segundo lugar, porque o resultado eleitoral que obtiver servirá para exigir contrapartidas doutrinárias, pelo apoio a oferecer no segundo turno.

Em entrevista à Folha de S. Paulo, que a publicou ontem, Ricardo Berzoini promoveu a candidatura do prefeito José Serra, a ser confirmada esta semana. Ao prever a vitória de Lula, disse que Serra tem idéias heterodoxas demais sobre economia, o que atemoriza o empresariado. Se Berzoini foi sincero, quis dizer que os homens de negócio que mandam no país (paulistas, of course) confiam mais em Palocci e em Henrique Meireles, e em sua ortodoxia monetária e neoliberal, do que no prefeito de São Paulo - o que é improvável. Se não foi sincero, e quis comprometer Serra com os neoliberais, que sempre nele confiaram, convinha-lhe vacinar-se contra a esperteza. Na filosofia das montanhas, esperteza é como certos carnívoros: quando é grande, mastiga e engole o dono.

Em entrevista à revista Caros Amigos, em sua edição de março, o ex-presidente Itamar Franco faz duras críticas a seu sucessor e lembra que o senador Pedro Simon foi firmemente contra a candidatura de Fernando Henrique. Fala sobre o desastre das privatizações, e conta como conseguiu impedir a venda de Furnas e a entrega completa da Cemig aos estrangeiros. O governo Fernando Henrique - disse Itamar - foi tão anti-nacional que, em certo momento, só faltava deixar o mastro e levar a bandeira. Ele revelou que o seu governo foi contestado pela mídia, desde o início, porque não escolhera um paulista, ou homem da confiança dos banqueiros para o Ministério da Fazenda. Lembrou também que Lula e Fernando Henrique não conseguiram ultrapassar o desempenho econômico de seu governo, medido pelo PIB, que chegou a 5,4%. Os índices do PIB de FHC e de Lula ficaram abaixo da média mundial e são dos mais baixos da nossa História. O PIB de outro mineiro - Juscelino, durante seus cinco anos - foi 25% acima da média mundial.

Será difícil frustrar as prévias no PMDB, marcadas para domingo. Dois candidatos postulam a indicação, e não obstante as diferenças entre um e outro, se identificam na mesma obstinação: o governador Germano Rigotto e o radialista Anthony Matheus de Oliveira - Garotinho para efeitos eleitorais.

É pena que só os dois se tenham inscrito para as prévias: há outros membros do PMDB que deviam disputá-las. O senador Pedro Simon é um deles. Outro é o próprio Itamar.