Título: Toque de recolher
Autor: Fabrício Marta e Vivian Range
Fonte: Jornal do Brasil, 13/03/2006, Rio, p. A6

Tropas do Exército bateram em retirada de pelo menos quatro favelas do Rio, entre a manhã e a tarde de ontem. Os soldados deixaram os morros do Pinto e da Providência (ambos no Centro) e as favelas da Mangueira (Zona Norte) e da Metral (Zona Oeste), no décimo dia da operação militar para recuperar os 10 fuzis e a pistola roubados do Estabelecimento Central de Transportes (ECT), em São Cristóvão, dia 3. O recuo do Exército foi comemorado pelos moradores. Simultaneamente ao toque de recolher das tropas, equipes do 1º Batalhão de Polícia do Exército vasculharam um prédio comercial desativado na Rua Conde de Bonfim, na Tijuca, próximo ao Morro do Borel. Apesar de o Comando Militar do Leste (CML) ter informado oficialmente, sábado, que não deixaria o Morro da Providência - onde enfrentara resistência armada dos traficantes - os soldados saíram do local no início da tarde. O tenente-coronel Paulo Meira, da Comunicação Social do CML, evitou os termos desocupação e retirada.

- O Exército não saiu dos morros. O que está acontecendo hoje (ontem) é uma operação de grande mobilidade das tropas. Não significa que abandonamos os morros - resumiu o oficial.

O CML deve divulgar hoje um balanço das operações. As favelas de Manguinhos, do Alemão, Jacarezinho e do Dendê continuavam ocupadas até ontem à noite.

Na Mangueira, onde um tanque de guerra ficou posicionado no viaduto de acesso à favela e 500 homens chegaram participar da ocupação, os militares ficaram até o meio da tarde, quando muitos moradores comemoraram nos bares a saída. A opinião sobre a presença das tropas na comunidade variava: alguns se sentiam mais seguros e outros afirmavam não suportar a visão dos homens camuflados ao lado das casas.

- O único problema foi a queda das vendas. Nesses dias, perdi 70% do meu faturamento. Algumas pessoas ficaram com medo de sair de casa - lamentou um comerciante, confessando que se sentiu mais protegido com a presença dos soldados.

Da favela da Metral, em Vila Kennedy, os militares iniciaram a desocupação por volta das 10h. Na madrugada, cerca de 200 moradores enfrentaram os soldados. Segundo o CML, por volta das 2h, durante um baile funk, dois traficantes armados com fuzis dispararam contra os militares e a tropa revidou. Não houve registro de feridos. Fiéis à lei do silêncio imposta pelo tráfico, os moradores da comunidade não comentaram o conflito.

- Cheguei em casa por volta das 2h e não vi nenhuma confusão. Até fiquei mais tranqüila de voltar para casa de madrugada, com a presença dos militares - contou uma moradora.

Desde o início da ação, 1.600 soldados já ocuparam 12 comunidades cariocas.