Título: Falhas começam na legislação
Autor: Lígia Maria
Fonte: Jornal do Brasil, 20/03/2006, Brasília, p. D3

A lei que instituiu os Juizados Especiais (9.099/95) não contempla adequadamente os casos de violência doméstica, avalia Juliana Santilli, promotora de Justiça do Núcleo de Gênero Pró-Mulher. Segundo ela, o arquivamento do inquérito devido ao desinteresse da vítima em representar contra o companheiro e o procedimento de punir o autor com cestas básicas são procedimentos criticados pela promotora. Além disso, ela lembra que casos em que o conciliador tenta induzir a vítima à conciliação têm suscitado debates acalorados sobre o papel dos Juizados Especiais Criminais. - A Lei 9.099 não contempla adequadamente os casos de violência doméstica, porque os procedimentos não são os mais adequados para resolver esses problemas - avalia a promotora.

Juliana Santilli critica a punição e seus resultados. De acordo com ela, os procedimentos da lei não garantem soluções para os casos mais sensíveis, como os que envolvem mulheres e idosos por exemplo.

- O ideal é que a medida contemple a função terapêutica ou de reabilitação, como o encaminhamento do agressor para a terapia de grupo - afirma a promotora, explicando que isso é o que transforma a situação psicológica e social da vítima e do agressor após o incidente.

A psicóloga Marília Lobão, do Núcleo Psicossocial (Nups) do Juizado Especial Criminal do Tribunal de Justiça, diz que o trabalho dos juizados não negligencia a complexidade do problema da violência doméstica. Tanto é que o Nups conta com 23 profissionais, que já atenderam mais de quatro mil famílias.

No entanto, Aldo de Campos Costa, professor de Direito da Universidade de Brasília, diz que o problema está nas conciliações, que por vezes são feitas por pessoas que não têm uma preparação sensível e de base humanista para tratar a questão.

- É preciso pacificar as situações sociais de conflito que chegam aos juizados. Acredito que a rotinização e a burocratização das práticas judiciárias, como engavetar um inquérito sem apuração, não estão de acordo com o espírito da lei dos juizados, que prevê a informalidade e a aproximação do operador do Direito com as partes - avalia o professor

Inovação - O Projeto de Lei nº 4559/04, que aguarda votação na Câmara dos Deputados, é visto como inovador para os casos de violência doméstica. De acordo com Juliana Santilli, há uma insatisfação muito grande em relação ao tratamento que os juizados especiais criminais dão às questões envolvendo violência contra a mulher.

- Com exceção de algumas experiências pioneiras, como a da Samambaia, o que ocorre, na maioria dos casos, é que os processos são encerrados sem averiguação - afirma a promotora.

Especial - O projeto de lei número 4559/04 propõe a criação do Juizado Especial Criminal Para Violência Doméstica Contra Mulher. A idéia é que é esses juizados tenham estrutura de atendimento, como centros de habilitação para os agressores.

A proposta acaba com o pagamento de cestas básicas e de prevenção contra as agressões. Entre elas estão a suspensão da inscrição do porte de arma e a possibilidade de prisão preventiva para o agressor.

- Isso é importante porque, por vezes, a mulher se sente ameaçada e a prisão preventiva oferece a ela uma maior segurança, até que a situação dela seja apaziguada - afirma a promotora.