Título: O plano B de Lula
Autor: Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 08/03/2006, Economia & Negócios, p. A17

O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) bate hoje o martelo sobre a nova taxa básica de juros do país (Selic), atualmente em 17,25%. A expectativa no mercado é de que o Copom reduza o juros em 0,75 ponto percentual, mas o Palácio do Planalto torce por uma queda de pelo menos 1 ponto. De Londres, onde cumpre visita oficial de três dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz figa por boa notícia na economia para fazer face à decepcionante expansão do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado, divulgada na véspera do carnaval pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A preocupação carrega um viés pragmático e está relacionada com a proximidade das eleições. O presidente teme que o baixo crescimento e as altas taxas de juros municiem a oposição durante a campanha eleitoral.

O Planalto também está preocupado com a reação do PT. O partido promete endurecer o discurso em relação à política econômica no encontro nacional marcado para o fim de abril. O PT não pretende pedir a substituição do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, mas setores da legenda já enviaram recados ao Planalto: precisam de pelo menos uma sinalização de mudança na política de juros sem a qual será mais complicado mobilizar a base social do PT para defender o governo nas eleições de outubro.

A insatisfação do partido virá traduzida num documento elaborado pela Comissão de Diretrizes de Governo cuja redação final é da lavra de Marco Aurélio Garcia, assessor de Lula para assuntos internacionais. O texto pede a redução acelerada das taxas de juros e a diminuição das metas oficiais de superávit primário (economia para pagamento de juros da dívida pública), hoje em 4,25% do PIB. Em suma, defende alterações profundas nas políticas monetária e fiscal.

Para o partido, as mudanças devem ser empreendidas desde já para que o último ano de Lula no governo soe como o ''primeiro ano do segundo mandato''. Aprovado pelo diretório nacional, o texto será encaminhado aos diretórios estaduais do PT, servindo de base para o grande encontro de abril. Para o partido, a retórica não é vazia, nem eleitoreira, e existe um ambiente macroeconômico favorável às mudanças exigidas.

- Vamos pressionar o governo no sentido de reduzir o superávit e as taxas de juros, de maneira acelerada. O texto resume e incorpora o pensamento e questões já discutidas pelo partido. Sabemos que se trata de um governo de coalizão, mas é preciso ficar claro que nós, do PT, não somos alinhados em todos os temas - disse ontem o secretário-geral do PT, Raul Pont.

Para Pont, é inaceitável que o Copom prossiga na lógica perversa de transferir recursos do setor produtivo para a especulação financeira, elevando a dívida pública, inibindo os investimentos e o crédito e, na ponta do processo, prejudicando os trabalhadores e a população.

O presidente do PT, Ricardo Berzoini, também reconhece a necessidade da queda das taxas de juros como forma de estimular o crescimento.

- Essa é a intenção do PT e de todo o povo brasileiro - disse.

Lula anseia pela queda na taxa de juros. O presidente não digeriu até hoje o crescimento de 2,3% no ano passado. Já tinha se conformado com um resultado fraco, em nome do combate à inflação. Mas os números do IBGE vieram ainda piores do que o estimado pelo Banco Central em dezembro do ano passado - 2,6% de expansão. Em recente conversa com um ministro do núcleo político, Lula disse que os juros terão de ser reduzidos e o crescimento, esse ano, não pode ficar abaixo de 5% do PIB. Patamar que economistas consideram difícil de ser atingido.