Título: Rivalidade histórica cede à cordialidade
Autor: SANTIAGO DO CHILE
Fonte: Jornal do Brasil, 11/03/2006, Internacional, p. A14

A capital chilena recebeu de braços abertos o presidente da Bolívia, Evo Morales, no início da histórica visita com o objetivo de assistir a posse da presidente eleita, Michelle Bachelet, hoje. O dirigente do Movimento ao Socialismo (MAS) agradeceu a seu colega chileno, Ricardo Lagos, por ter comparecido à sua, em fevereiro, e destacou o fato de Bachelet ser a primeira mulher chefe de Estado no país.

Cerca de 300 organizações sociais e políticas organizaram, em homenagem ao boliviano, um ato público no Complexo de Tênis do Estádio Nacional de Santiago, com capacidade para 6 mil espectadores.

Após desembarcar no aeroporto, Morales e sua comitiva se dirigiram ao Palácio de La Moeda, onde foi recebido por uma guarda de honra e se reuniu com Lagos. O presidente considerou a homenagem que recebeu ''um sinal de irmandade''. Santiago e La Paz suspenderam as relações diplomáticas em 1978 por causa de um litígio que se arrasta desde o Século 19, quando a Bolívia perdeu seu acesso ao Pacífico em uma guerra contra o Chile.

Embora o governo mantenha a reivindicação marítima como prioridade, Morales optou pela diplomacia para se reaproximar do Chile. Além disso, ofereceu vender gás ao vizinho, em uma guinada à política dos antecessores, que condicionavam a negociação à obtenção da saída marítima.

Lagos, antes da chegada do convidado, previu um bom ambiente para as relações chileno-bolivianas. Ele deve passar a Presidência a Bachelet na sede do Parlamento, em Valparaíso, a 120 km de Santiago.

Enquanto isso, organizações destacaram a figura do líder boliviano. Intelectuais, artistas e escritores divulgaram declaração na qual se pronunciam a favor de que Chile conceda finalmente a saída ao mar à Bolívia. Entre os signatários estão o poeta Raúl Zurita, Prêmio Nacional de Literatura, e os escritores Damiela Eltit e Pedro Lemebel; além de o músico Mauricio Redolés e das atrizes Adela Secall, Patricia López e Antonia Zegers.

''Todos os nossos mapas foram traçados com sangue, e hoje temos a oportunidade única de redesenhar as fronteiras com justiça e solidariedade'' afirma a declaração. ''É momento de apoiar a legítima reivindicação do povo boliviano'', acrescenta o texto.

Um contingente de 3.200 policiais em Santiago e Valparaíso será responsável pelo esquema de segurança em torno dos cerca de 30 chefes de Estado que participarão da posse, ao lado de mais de 1.200 jornalistas de todo o mundo. Lagos, socialista e agnóstico como sua sucessora, passará a Michelle Bachelet a missão de continuar a tarefa dos três governos anteriores da Concertación Democrática, a coalizão de centro-esquerda que há 16 anos substituiu a ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990).

A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, a ministra da Defesa francesa, Michelle Alliot-Marie, e a primeira-ministra da Nova Zelândia, Helen Clark, simbolizarão a presença feminina na cerimônia, que começará ao meio-dia.