Título: ONU investiga abusos sexuais
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 24/11/2004, Internacional, p. A-8

As 150 acusações atingem funcionários civis e soldados

NAÇÕES UNIDAS - As Nações Unidas estão investigando cerca de 150 acusações de abuso sexual contra funcionários civis da organização e soldados das forças de paz na República Democrática do Congo e reconhecem que dispõe de provas fotográficas e vídeos em alguns casos.

Em entrevista coletiva na noite de segunda-feira, a secretária-geral adjunta para temas de manutenção da paz, Jane Holl Lute, revelou que as acusações incluem casos de pedofilia, estupro e prostituição, que foram denunciadas pelas próprias vítimas e colegas dos supostos autores.

A secretária indicou que o caso expôs a insuficiência e inadequação das medidas tomadas pela organização sobre ética profissional e padrões de conduta, dada a complexidade das missões atuais e o aumento do número de operações de paz.

Depois de reconhecer que isso não desculpa a organização, assinalou que serão tomadas medidas para reforçar a prevenção de crimes, a identificação do problema e a resposta, com medidas disciplinares.

- Estamos trazendo o problema à tona, para determinar nossa meta, e não vamos parar por aqui - frisou Lute.

A secretária não revelou o número de envolvidos, mas indicou que alguns suspeitos cometeram mais de uma ofensa.

Em maio, as Nações Unidas divulgaram 30 casos de abusos entre membros das forças de paz na cidade de Bunia (Nordeste), onde a metade dos mais de 10 mil soldados está deslocada.

Além disso, o último relatório da missão da ONU no Congo (Monuc), divulgado em agosto, indicava que havia acusações graves, incluindo de exploração sexual - prostituição e estupro - de menores e de mulheres em acampamentos para deslocados internos e em algumas cidades.

Recentemente, um soldado francês e dois tunisianos foram enviados de volta a seus países e outros três funcionários civis também foram afastados.

A organização tem jurisdição sobre o pessoal civil, mas as tropas são atribuições de cada país. Como consequência disso, o único que a ONU pode fazer é pedir que a nação repatrie o soldado acusado e o puna em casa.

No mês passado, Jean-Marie Guehenno, sub-secretário geral da ONU para as forças de paz, visitou o Congo e prometeu fazer uma revisão geral para garantir a disciplina das tropas. Além disso, Lute informou que seu departamento está enviando duas equipes para lidar com os vários aspectos do problema.

Em breve, as autoridades devem divulgar um novo relatório, mais detalhado, sobre os casos de abuso em Bunia.

A missão das Nações Unidas no Congo tem 10.800 soldados de forças de paz e 60 funcionários civis, de mais de 20 nacionalidades diferentes.

As revelações de abusos por parte das forças de paz geralmente não são divulgadas pela organização humanitária até que relatórios ou os próprios países informem a notícia, como ocorreu no Camboja no início dos anos 1990 e mais tarde na Somália, Bósnia e Etiópia.

Na sexta-feira, o secretário-geral Kofi Annan manifestou repúdio aos abusos.

- Temo que existam evidências claras de que atos grosseiros de má-conduta tenham ocorrido - disse. - É vergonhoso para a ONU ter de admitir isso.

Segundo Annan, as acusações se referem a um número pequeno de funcionários e prometeu que os obrigará a se explicar.

- Há muito tempo deixei claro que minha atitude em relação a casos de exploração sexual e abusos é de tolerância zero, sem exceção, e estou determinado a implementar esta política da maneira mais transparente possível.