Título: Um tucano em condições de vôo
Autor: Juliana Rocha e Leandro Mazzini
Fonte: Jornal do Brasil, 15/03/2006, País, p. A3

Com bons números na gestão do governo paulista, a ascensão do governador Geraldo Alckmin vai incomodar o presidente Lula na campanha, na análise de cientistas políticos. Isso porque os petistas não poderão colocar na conta dele os oito anos de governo Fernando Henrique, como se esperava com José Serra, o preterido. Todo o trabalho de Alckmin convenceu a cúpula do partido e surpreendeu especialistas.

O processo de escolha foi uma prova de fogo para os nervos dos dois pré-candidatos. O veredicto saiu apenas duas horas antes do anúncio oficial, na sede do partido, às 16h30 de ontem. Partiu do prefeito José Serra a decisão de não levar a disputa adiante, depois de ser informado de que seria impossível não haver as prévias, uma vez que os cinco governadores do partido apoiavam Alckmin.

Para Lúcia Hipólito, doutora em Ciências Políticas e especialista em partidos, o PSDB fez a escolha certa. Como candidato de fato, o apetite de Alckmin pelo poder se voltará contra o presidente e pode mudar o quadro desfavorável ao tucano nas pesquisas.

- Escolher Serra era olhar pelo retrovisor - comparou Lúcia, para quem essa alternativa seria reviver a campanha de 2002. - Alckmin foi surpreendente. Mostrou que tem espaço para crescer. E além de tudo é da escola de (Mário) Covas.

A partir de agora, os números das pesquisas vão mudar, acredita o cientista político Luiz Henrique Bahia, da Uerj. Alckmin deve subir, se apresentar um bom programa:

- Serra é o melhor opositor agora, o que não quer dizer que, nos próximos meses, Alckmin não venha a crescer. Através de um bom projeto e muita publicidade, ele pode conquistar as camadas C, D e E.

O fato de Alckmin ser carismático e compenetrado nos temas que debate faz dele um forte oponente, disse Geraldo Tadeu Monteiro, diretor do Instituto Brasileiro de Pequisa Social (IBPS). Para ele, a escolha foi o melhor ''custo-benefício'' para a legenda.

- Serra é carrancudo, passa imagem de antipático, e o Alckmin não, é o tipo de candidato que saberá lidar com a TV para se sair bem na campanha. Sobre Serra pesa o fato de ter sido integrante do governo FH, e muitas pessoas acham que o governo Lula é melhor.

Serra até tentou a última cartada para mostrar que queria concorrer, chamando a imprensa para declarar, pela primeira vez, a pré-candidatura. Pressionado para decidir se queria ou não disputar a Presidência, deu um tiro no pé. A idéia teria surgido de aliados, como os deputados Eduardo Paes (RJ), Márcio Fortes (RJ) e Jutahy Magalhães Jr. (BA). Amigos de Serra dizem que a pressão veio da cúpula.

A notícia pegou de surpresa os caciques tucanos - Fernando Henrique Cardoso, Aécio Neves e Tasso Jereissati (CE) - que às 22h de segunda, estavam reunidos na Prefeitura de São Paulo. Serra ouviu da cúpula tucana que seriam as prévias ou nada. Aécio, encarregado de consultar os governadores, ouviu de todos eles apoio à Alckmin. Caso Serra não desistisse, o Diretório Nacional deveria ser reunido na sexta-feira para uma ampla consulta.

Em reunião reservada de apenas 40 minutos na prefeitura, Serra comunicou sua decisão ao governador. Resolvido o impasse, Alckmin seguiu para um almoço com os governadores e a cúpula.