Título: Ataque no caminho da paz
Autor: Sheila Machado
Fonte: Jornal do Brasil, 15/03/2006, Internacional, p. A13

A retomada das negociações entre israelenses e palestinos, sob as diretrizes do Mapa do Caminho, já estava complicada pela chegada ao governo palestino do grupo radical Hamas. Desde então, os extremistas foram alvo de uma campanha internacional, especialmente da Rússia, para que abandonassem o terrorismo, reconhecessem o Estado de Israel e aceitassem negociar com Jerusalém. O processo ia a passos lentos, porém positivos - há meses não há atentados do Hamas - até ontem, quando Israel invadiu com tanques, foguetes e soldados a prisão da Autoridade Palestina em Jericó. A ação violenta enterrou qualquer possibilidade - a curto prazo - de diálogo, dizem analistas, e fez recrudescer o ódio em todo o mundo árabe.

- A mensagem que os israelenses passaram foi: não queremos tratar com o lado palestino, não confiamos na capacidade de administração da ANP - explicou ao JB a advogada Stephanie Koury, pesquisadora do programa de Direito e Construção de Paz no Oriente Médio, da Universidade de Londres.

A operação do Exército tinha como objetivo capturar o líder da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), Ahmed Saadat, que estava prisão de Jericó. Acusado do assassinato do ministro de Turismo israelense, Rehavam Zeevi, em 2001, Saadat recebeu uma ordem de libertação da Suprema Corte Palestina, em 2002, para quem não havia prova da ligação do dirigente com o atentado contra Zeevi. Israel prometeu que se fosse libertado, Saadat seria morto. O Gabinete palestino bloqueou a ordem, mas com a chegada ao poder do Hamas, os israelenses interpretaram que o réu conquistaria a liberdade.

- Tudo isso acontece, em parte, porque o Hamas integra o governo palestino - admitiu Gideon Meir, vice-diretor-geral do Ministério de Relações Exteriores em Tel Aviv.

Enquanto a ação em Jericó prosseguia, o presidente da ANP, Mahmoud Abbas garantiu que manteria Saadat preso - embora na semana passada tenha insinuado que estava ''pronto'' para libertá-lo.

- Sequer consideramos a proposta. É patética e ridícula - esbravejou uma autoridade israelense ao Jerusalem Post, sob anonimato. - Se a ANP não é capaz de manter os assassinos detidos, nós sabemos fazer justiça.

Para a analista Stephanie, o recado que a ANP recebe da ação em Jericó é ''qual é o objetivo de melhorar a segurança se os israelenses vêm destruir tudo?''

- Israel não mostrou evidências de que sua segurança estava em risco com a eventual liberdade de Saadat - critica. - Destruir a prisão, matar palestinos é um ciclo, só mina a segurança israelense.

Stephanie lembra ainda que na semana que vem, Israel vai às urnas para escolher o novo Parlamento, que por sua vez elege o primeiro-ministro. Provavelmente será confirmado no cargo o premier interino, Ehud Olmert. A ação de ontem também pode ser lida como uma manobra para barrar a ameaça da extrema-direita representada pelo partido Likud.

- É como se o governo quisesse deixar claro: mandamos na região. Ao mesmo tempo, se Israel não dá poder para que os palestinos cuidem de suas questões, não pode cobrar as falhas mais tarde - sustenta a advogada.

O principal negociador palestino, Saeb Erekat, classificou a ação como uma ''provocação'' a distúrbios.

- Não entendendo porque Israel quer partir para a guerra. O ataque sugere que é iminente - disse.