Título: Violência atinge militares da ONU
Autor: Olivia Hirsch
Fonte: Jornal do Brasil, 25/11/2004, Internacional, p. A8

Onze soldados argentinos, recém-chegados no país, foram assaltados e agredidos num dos bairros mais perigosos da capital

Onze militares argentinos que trabalham na Força Aérea e servem de apoio para a Missão de Estabilização da ONU no Haiti (Minustah), liderada pelo Brasil, foram assaltados e agredidos no domingo de manhã no bairro de Cité Soleil, um dos mais perigosos de Porto Príncipe, por homens armados.

O grupo, que estava a paisana e de folga, viajava para a região Norte da capital quando foi interceptado por três carros e levado para o bairro, que fica no litoral. Eles tiveram documentos, dinheiro e objetos pessoais roubados, mas parte do material foi devolvido depois.

- Eles chegaram há pouco tempo no Haiti e não conheciam os locais perigosos. É como no Brasil, tem áreas que é melhor se evitar - explicou o assistente do comandante da força da Minustah, Comandante Carlos Chagas. - Eles decidiram qual seria o trajeto apenas olhando no mapa, para ver qual seria o caminho mais curto, mas não levaram em consideração quais áreas são mais violentas.

Na própria manhã de domingo, o general brasileiro Augusto Heleno, chefe militar da Minustah, acompanhou patrulhas de fuzileiros navais que percorreram o bairro e conseguiram apreender carros usados na emboscada.

- Os ladrões sabiam que eram pessoas das Nações Unidas, pois estavam numa van com a identificação da organização, mas não acredito que tenha sido uma ação contra nós. Foi um incidente isolado - afirma o comandante. - Prova disso foi a devolução de parte do que foi roubado. Acho que receberam alguma orientação e logo depois, enquanto os soldados pediam ajuda, eles apareceram para entregar as identidades dos militares, parte do dinheiro e até uma câmara de vídeo.

Segundo o comandante, todos os 11 argentinos se ofereceram para participar das operações de reconhecimento dos ladrões e três deles, que tiveram envolvimento direto no assalto, já foram presos. Outros três suspeitos também foram detidos.

Agências de notícias internacionais chegaram a informar que os integrantes do grupo foram obrigados a ficar apenas de cueca durante o assalto, o que foi negado categoricamente pelo militar brasileiro: ''É claro que passaram por uma situação desagradável, bateram neles, mas essa informação é absurda, não tem qualquer fundamento'', frisou.

O possível fracasso da missão de paz foi alertado em um recente relatório do centro de pesquisa independente International Crisis Group. O documento diz que as armas, tanto de simpatizantes do ex-presidente Jean Bertrand Aristide quanto de seus rivais devem ser retidas imediatamente e que a comunidade internacional precisa se comprometer por pelo mais 10 anos para que as forças de paz sejam bem-sucedidas.

- O Haiti está sendo levado em direção à anarquia, porque nem o governo interino nem as forças internacionais conseguiram desarmar os grupos ilegais - ressaltou Allain Deletroz, diretor do Programa de América Latina e Caribe.

O documento ainda aponta que a falta de efetivo da Minustah - apenas um terço do previsto foi deslocado - fez com que a missão falhasse em estabilizar o Haiti, a principal meta no país. ''Sua inércia ainda permitiu que o Exército desmobilizado se consolidasse, tornando mais difícil confrontá-lo no futuro'', indica o relatório.

Entre as recomendações propostas, estão a implementação de uma estratégia mais pró-ativa por parte da missão de paz e um maior envolvimento da Comunidade do Caribe (Caricom), que deve reconhecer o governo provisório e reintegrar o país como membro ativo.