Título: Avanços contra a seca :: Francisco de Queiróz Maia Júnior
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 18/03/2006, Outras Opiniões, p. A11

O ano de 2005 foi o quinto ano mais seco que o Ceará teve nas últimas três décadas. A queda de safra foi de 60%. Mas, mesmo assim, não se ouviu falar em saques, frentes de emergência, rebanhos morrendo de sede e fome.

Desde 1998, a execução de 2026 projetos hídricos reduziu de dois milhões para menos de 350 mil o universo de cearenses passíveis de terem problema com abastecimento à água. Naquele ano, quando a seca foi menos severa que 2005, o estado demandou cerca de 600 carros-pipa. No ano passado, 29% desse total foram suficientes.

Isso está ocorrendo porque as políticas de convívio com as secas estão mais consistentes. No Ceará essas estratégias atuam em quatro grandes eixos: transferência emergencial de renda; consolidação de infra-estrutura; capacitação de pessoas; e modernização agropecuária e crédito rural.

O Fundo Estadual de Combate à Pobreza (Fecop) é uma estratégia de transferência de renda que tem se revelado importante para o convívio com as secas, na medida em que beneficia os municípios mais carentes. Programas federais como Bolsa Família e o Funrural também têm seus méritos. A assistência social e transferência de renda, contudo, devem ser consideradas como estratégias transitórias. Mais importante ainda é criar condições de desenvolvimento sustentável. Isso inclui a infra-estrutura.

Até 1983 o Ceará não tinha rio perene. Hoje, os açudes perenizam 2,5 mil quilômetros de rios. Em 18 anos o estado dobrou sua capacidade de armazenagem de água. Entre 1992 e 2004, a quantidade de domicílios com água adequada subiu de 45,1% para 75,5%. Nas áreas de transporte, eletrificação e comunicação os dados são igualmente expressivos. Os sertanejos estão menos dependentes da capital. Entre 2000 e 2003, o PIB do interior cresceu mais que o da Região Metropolitana de Fortaleza.

No que se refere à capacitação de pessoas, há nítidos avanços. Entre 1992 e 2004, a taxa de escolarização de crianças evoluiu de 80,8% para 96,2%. A disseminação do conhecimento também ocorre com a interiorização das três universidades estaduais, bem como da Rede Centec de Educação Tecnológica - que conta com 43 unidades. O governo também lançou o programa Unicampo, voltado especificamente para fomentar a formação de capital humano junto a pequenos agricultores . Criado em 2005, o programa Agente Rural pode abrir novas perspectivas para o pequeno produtor: mais atenção, acompanhamento sistemático e transferência de conhecimento. Os agentes rurais vão trabalhar a organização e o aporte tecnológico para cerca de 24 mil agricultores de base familiar, em 2006.

Outro instrumento importante de convívio com a seca é o seguro-safra. No ano passado, 132 mil pequenos produtores cearenses se habilitaram ao programa, dos quais 115 mil estão aptos a receber R$ 63,25 milhões. O crédito e a capacitação também estão mais acessíveis. Em 2005, o Pronaf financiou R$ 159,6 milhões no estado. Nesse sentido, é importante reconhecer a disposição do governo federal e instituições como o Sebrae e os bancos do Nordeste em apoiar o pequeno produtor.

Os crescentes investimentos em capacitação, assistência técnica e crédito rural, por sua vez, vêm se desdobrando rapidamente em geração de emprego e renda no interior. Entre 1999 e 2005, o valor bruto da produção agropecuária evoluiu de R$ 1,61 bilhão para R$ 3,15 bilhões.

As exportações de frutas e flores dos pólos de irrigação, por exemplo, saltaram de US$ 1,9 milhão, em 1999, para US$ 44,6 milhões no ano passado. Essas e outras iniciativas têm permitido evitar reduções bruscas na renda agrícola cearense, mesmo quando se enfrenta anos difíceis como 2005.

Estamos, portanto, cada vez mais habilitados a conviver com as estiagens. As novas gerações estão mais prontas para enfrentar com destemor os períodos de seca extremada e prover com dignidade o sustento de suas famílias.