Título: O dilema de Lula
Autor: IRINEU TAMANI
Fonte: Jornal do Brasil, 28/10/2004, Opinião, p. A11

Sobre a mesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva repousam, há dias, duas listas tríplices: a primeira, para preenchimento de vaga de ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em substituição a Francisco Fausto, que se aposentou; a segunda, para desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com sede em Brasília, decorrente da vaga de Plauto Ribeiro, também aposentado. Embora tenha o poder da caneta, o presidente sabe que a escolha não é tão simples como parece.

É aqui que política e Judiciário se confundem. Nas duas listas, tanto para a área trabalhista quanto para a área federal, os seis candidatos têm padrinhos fortes e que farão de tudo para conseguir emplacar junto ao presidente da República os nomes dos dois escolhidos ao final da disputa. O momento para cada um dos candidatos é procurar ampliar o número de apoios políticos, caso contrário ficarão sem condições de concorrer.

Pela primeira vez, por exemplo, aparecem nas duas listas candidatos negros e de sexos opostos: a juíza federal Neuza Maria Alves da Silva e o juiz do Trabalho Horácio Raymundo de Senna Pires. No entanto, ambos são baianos e contam, naturalmente, com o apoio do todo-poderoso de sempre, o senador Antônio Carlos Magalhães. O fato torna mais complicada ainda a definição por parte de Lula.

Responsável pela primeira nomeação de um ministro negro para o Supremo Tribunal Federal - Joaquim Barbosa -, o presidente da República sabe que o Movimento Negro da Bahia vai lutar até o fim para que seus candidatos sejam nomeados. A pressão virá também da união de dois políticos que são inimigos históricos na Bahia: ACM e o ex-governador baiano Waldir Pires, Controlador-Geral da União. Os partidos políticos baianos, do PT ao PFL, passando pelo PSDB, estão unidos na questão dos candidatos ao TST e ao TRF.

Ocorre que Lula já nomeou um juiz negro, mas ainda não teve a oportunidade de nomear uma juíza negra. O TST já tem ministro negro - Carlos Alberto Reis de Paula, o primeiro ministro negro dos Tribunais Superiores e nomeado no governo Sarney -, mas não tem nenhum representante da Bahia. Por sua vez, o TRF da 1ª Região não tem nenhum integrante negro, embora conte com vários desembargadores federais que nasceram na terra do axé.

Mas os outros candidatos às duas vagas - todos brancos e homens - também não ficam atrás no prestígio político dos seus respectivos padrinhos. Assim como a Bahia, o Estado de Minas Gerais tem candidatos: o juiz Márcio Ribeiro do Vale, atualmente presidente do TRT mineiro, e o juiz federal Ricardo Rabelo. Conhecendo as regras do jogo, o governador Aécio Neves já vem trabalhando nos bastidores para conseguir, pelo menos, uma das vagas. Ele sabe das dificuldades de emplacar os dois nomes porque a terra do pão-de- queijo possui vários representantes nos dois Tribunais. No TRF, por exemplo, são nove juízes mineiros e cinco baianos. No TST, são quatro mineiros, incluindo o seu presidente, Vantuil Abdala, natural de Muzambinho.

Os outros dois candidatos são do Rio de Janeiro, postulante à vaga no TST, e do Maranhão. O juiz carioca Aloysio Corrêa da Veiga tem o apoio do prefeito reeleito César Maia, que ganhou vários pontos para entrar em uma disputa presidencial dentro de dois anos quando estiver terminando o mandato de Lula. O problema é que o presidente da República ao nomear, recentemente, o primeiro ministro da sua gestão para o TST escolheu um nome do Ministério Público do Trabalho - Lélio Bentes - que nasceu em Niterói, no Rio de Janeiro. Já o juiz federal maranhense Reinaldo Soares da Fonseca, que atua na 22ª Vara Federal em Brasília, tem um padrinho muito forte: o presidente do Senado, José Sarney.

Se Lula usar a lógica para definir os nomes dos dois candidatos, deve indicar a juíza Neuza Maria Alves da Silva para o TRF e o juiz Aloysio Corrêa da Veiga para o TST. A juíza baiana, porque ele não vai nomear o segundo ministro negro e deixar de fora uma mulher negra.