O Globo, n. 32.294, 06/01/2022.Política, p.6

“O PRESIDENTE FALOU: ESTOU MORRENDO A COISA ESTÁ RUIM” 
Antônio Luiz Macedo / Cirurgião


Médico que acompanha Jair Bolsonaro desde o atentado a faca em 2018, o cirurgião Antônio Luiz Macedo, responsável pela internação do mandatário na madrugada de segunda-feira, em São Paulo, classificou o episódio de obstrução intestinal de Bolsonaro como “perigoso”. Assim como o ocorrido há seis meses, o caso não precisou de cirurgia, mas o médico reafirmou ao GLOBO que o presidente deverá mudar a rotina para evitar que o problema se repita. Ontem pela manhã, Bolsonaro teve alta do Hospital Vila Nova Star. Desde que recebeu a facada na barriga durante ato de campanha em Juiz de Fora (MG), ele já passou por seis cirurgias.

O que causou a obstrução intestinal?

O camarão que ele consumiu na véspera. Ele não foi mastigado. No caso dele (Bolsonaro), não mastigar muito bem os alimentos aumenta o risco do problema.

Desde 2018, quando levou a facada, o presidente tem sido internado com obstruções intestinais com frequência. O que ele deveria fazer para evitar esse tipo de complicação?

Caminhar absolutamente todos os dias. Meia hora de manhã, meia hora de tarde. Isso melhora o peristaltismo intestinal (os movimentos involuntários realizados pelo órgão que facilitam a digestão) e deverá ser feito para sempre. Deve mastigar 15 vezes os alimentos também.

O que ele não deve fazer?

Tem que evitar alimentos como carne, castanha de caju e amendoim, que formam um bolo que passa com mais dificuldade pelo intestino. Deve também evitar subir em caminhões ou lugares altos. Se o impacto de uma queda atingir a região fragilizada, que é o lado esquerdo na altura do umbigo, pode romper o intestino. Nesta semana, especialmente, os cuidados têm de ser ainda maiores. Aconselhei a dona Michelle (Michelle Bolsonaro) a botar um cadeado na moto dele. Não pode fazer força também por um bom tempo; a força pode fazer o abdome torcer.

Hoje, logo depois da alta hospitalar, Bolsonaro disse que seria “difícil seguir” a dieta recomendada. E se ele não seguir?

O risco de nova obstrução é considerável.

O tipo de obstrução que acometeu o presidente desta vez foi mais delicado em relação à última internação, há seis meses?

Foi menos grave. Ele se recuperou rapidamente. Mas não existe “pequena obstrução” no caso do presidente. O intestino está todo colado na parede devido a vários fatores — à própria facada, às cirurgias, às infecções e aos sangramentos já ocorridos. É sempre perigoso, portanto. Na hora que passamos a sonda nele, saiu um litro de suco gástrico do estômago. Se ele vomitasse, o líquido entrava nos pulmões, e ele morria.

Se ele não tivesse procurado ajuda médica, corria risco de morrer?

Não existe essa possibilidade de não procurar socorro médico. A dor é pavorosa. É como alguém bater com um martelo na barriga com força. O presidente é forte.

Como o senhor foi comunicado sobre a nova obstrução intestinal?

Ele me ligou chorando de dor. Falou: “Estou morrendo, Macedo. A coisa está ruim”. Mandei ele ir na hora para o Vila Nova Star, liguei para o Pedro (Pedro Henrique Loretti, diretor do hospital), que orquestrou tudo com muita competência. Quando cheguei, analisei a tomografia, os exames de sangue e toquei na barriga dele. Quando apalpei, vi que o intestino não estava rasgando e estava mais molinho. Foi muito bom. Porque qualquer cirurgia que for feita nessa região dificilmente vai durar menos de 12 horas