Título: Mudanças para o século 21
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 06/12/2004, País, p. A-2

A universidade tem duas finalidades centrais: o sucesso pessoal de seus alunos e a transformação intelectual e social do mundo. Atualmente, ela não está realizando plenamente esses dois objetivos. O sucesso pessoal está ameaçado pelo desemprego, pelos baixos salários, pela disputa com profissionais que aprendem fora da universidade. A capacidade de transformar está ameaçada pelo descompasso entre as técnicas criadas na universidade e a dinâmica com a qual o conhecimento avança fora dela e pelo isolamento das soluções encontradas por ela para atender às necessidades da humanidade, principalmente às das camadas pobres.

Essa perda da capacidade de realizar suas finalidades decorre de quatro fatores: o conhecimento avança mais depressa do que a universidade pode acompanhar; avança mais fora do que dentro da universidade; o conhecimento universitário perdeu sintonia com as necessidades do mundo; e finalmente, a universidade não consegue se ajustar às mudanças dos instrumentos de ensino.

Por isso, essa instituição milenar está sendo reformada em todo o mundo. O Brasil precisa muito dessa reforma. Nossa última reforma universitária data de 1968, feita por um regime militar e orientada por assessores norte-americanos. De lá para cá, tudo mudou, mas a universidade pouco se ajustou, apesar do seu enorme crescimento e de sua extraordinária colaboração com o atual modelo de desenvolvimento do país. Agora, ela precisa se tornar eficiente, sintonizada com o avanço do conhecimento e das exigências da sociedade. Mas existe o risco de que a reforma em elaboração seja tímida, restrita aos aspectos de financiamento e ingresso. O Brasil tem a tradição de realizar suas reformas de forma incompleta. A universidade não deve se submeter a essa tradição, deve fazer uma reforma completa, se refundar para se ajustar ao mundo do século 21.

A universidade precisa redefinir seu conceito de público e privado. A reforma será incompleta se continuar considerando público o curso da universidade estatal, e privado o curso da universidade particular. Se faltam vagas na universidade estatal para formar os professores de educação básica de que o Brasil precisa, os cursos de licenciatura na universidade privada considerados de interesse público não deveriam ser pagos pelos alunos.

A universidade precisa abandonar a visão linear de departamentos, definidos por categoria do conhecimento, e se organizar por temas da realidade, com disciplinas novas, multidisciplinares. A estrutura da universidade do futuro deve ser tridimensional. O aluno deve se dedicar a estudos em um núcleo multidisciplinar, organizado por temas da realidade, em que poderá se preparar para sua profissão.

A duração dos cursos tem de mudar radicalmente. Nada justifica que, no século 21, a formação de um profissional gaste o mesmo tempo de há cem anos, sobretudo se o conhecimento adquirido estará obsoleto em poucos anos. Além de reduzir o tempo da primeira formação, a universidade precisa manter um sistema constante de reciclagem e revalidação dos diplomas.

A reforma deve ainda considerar os avanços da teleinformática e atualizar os conceitos de campus, uso do tempo e presença física. O ensino à distância vai levar a universidade a todas as partes, oferecendo acesso a alunos de qualquer cidade, e permitindo que sigam cursos ministrados por professores de outras universidades.

A reforma da universidade deve ser radical, para que ela se ajuste às exigências do século 21, retome seu compromisso com a qualidade e realize suas grandes finalidades centrais - o sucesso pessoal de seus alunos, a transformação social e o enriquecimento cultural do mundo em que vivemos.